Tudo cabe na caixa dos bebês
Eles vão entrar, sair, virar, sentar, empurrar, empilhar - e se desenvolver
17/08/2015
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Jornalismo
17/08/2015
Você fica horas escolhendo um presente bem bonito, prepara um embrulho caprichado, entrega para a criança e espera a reação dela. Mas, para a surpresa geral, o brinquedo é rapidamente deixado de lado e o que chama mesmo a atenção é aquela caixa grande e colorida. Não tem jeito: bebês e crianças pequenas adoram esses recipientes! A fascinação traz a chance para o aprendizado na creche. Basta, com o perdão do gracejo irresistível, pensar fora da caixinha.
Foi o que fez Gislaine Carla Pilz Stoeberl, professora do CEIM Tempo Mágico, em São Bento do Sul, a 249 quilômetros de Florianópolis. Depois de mais de uma década trabalhando com crianças de 3 e 4 anos, ela encarou o desafio de assumir uma turma de bebês com faixas etárias bastante heterogêneas, entre 4 meses e 1 ano e 7 meses. Ao iniciar a nova função, a educadora estudou muito a respeito da organização dos espaços no berçário e começou a observar o comportamento dos pequenos. "Percebi que, quando trazia caixas para guardar brinquedos, eles demonstravam vontade de pegá-las, ajudar a pôr os materiais dentro e virá-las em seguida", conta. A constatação foi a base para elaborar uma sequência de nove atividades, realizadas por dois meses.
Interação individual e coletiva
Gislaine organizou as propostas de modo a dar às crianças a oportunidade de explorar diversas caixas sozinhas e em grupo. "Minha preocupação era garantir a interação e a experimentação por meio do movimento e da afetividade."
A primeira atividade foi sentar os bebês individualmente dentro de caixotes de tamanho médio e arrastá-los pela sala, realizando um passeio. Ao serem puxados, os pequenos se seguravam nas bordas, alguns imitando sons de carro. Para acomodar os mais novinhos, a docente colocou um edredom dentro da caixa, ajudando-os a sentar de forma mais confortável. As crianças um pouco mais velhas, por sua vez, tentavam entrar e sair sozinhas e ajudavam a empurrar as menores. "Essa brincadeira é muito adequada à faixa etária. Ela diverte a turma, trabalha motricidade, interação e envolve questões de tempo e espaço", afirma Ana Paula Yazbek, orientadora pedagógica do Berçário da Vila, em São Paulo.
Para a proposta seguinte, Gislaine encapou e decorou 15 caixas de sapatos com gravuras e fita transparente e as levou para os bebês. O objetivo era proporcionar a exploração dos materiais e a criação de brincadeiras com outros itens, como chocalhos e bolinhas. No começo, os pequenos ficaram só observando. Aos poucos, foram andando ou engatinhando até as caixas e começaram a analisá-las. "À medida que os dias passavam, viravam-nas e tentavam subir nelas, batiam no fundo, colocavam e tiravam objetos de dentro", conta ela. A professora, então, enviou os caixotes para as crianças brincarem em casa, colocando sugestões de atividades para ser desenvolvidas. "Pensei algumas propostas que incluíam pais e irmãos, aguçando a curiosidade deles sobre o trabalho realizado na escola", explica.
O terceiro desafio foi entrar e sair das caixas. Gislaine selecionou algumas com a lateral mais baixa e estimulou as crianças a erguer a perna, passar para o lado de dentro, sentar e sair. Para os bebês que ainda não andavam, a educadora fez uma adaptação: eles foram colocados sentados dentro de caixotes em frente a um espelho para observarem a posição em que estavam.
Depois de muita diversão em sala, chegou a hora de explorar outro ambiente. Com a ajuda das auxiliares da creche, Gislaine levou os pequenos para o refeitório e distribuiu caixas pelo espaço para que se divertissem livremente. Eles empilharam os materiais, entraram neles, brincaram de esconder e tentaram empurrar os colegas. "Preparar um ambiente que permita à criança fazer descobertas que auxiliem no desenvolvimento da autonomia é fundamental e tem tudo a ver com a fase motora em que ela está, voltada à percepção do mundo", diz Adriana Klysis, diretora da Caleidoscópio Brincadeira e Arte.
A importância do educador
Além de deixar que a turma interagisse por conta própria, Gislaine organizou propostas em que o apoio do adulto era necessário. Na primeira, a educadora preparou caixas vazadas, com círculos de tamanhos diferentes. As crianças receberam diversas bolinhas e foram desafiadas a colocá-las dentro. Conforme iam tentando, a docente fazia intervenções, ajudando a comparar os objetos e ver quais passavam pelos buracos.
Na atividade seguinte, a professora recorreu a um brinquedo que sempre desperta o interesse dos pequenos: o túnel. Uma caixa de fogão com uma passagem recortada foi a base para a atividade. Gislaine estimulou a turminha a atravessar andando ou engatinhando, criando as próprias estratégias. "Dessa forma, a docente amplia o repertório de brincadeiras de bebês e crianças pequenas, desenvolve as possibilidades de movimento e promove as linguagens gestual, oral e cinestésica", afirma Ana Paula.
Outras duas iniciativas nessa linha envolveram caixas de sapatos que abriam como uma gaveta. Uma delas a professora encheu com utensílios de casa, que os bebês podiam tirar e colocar quanto quisessem. Costumavam, então, explorá-los com as mãos e a boca, procurando descobrir para que serviam: colocavam o telefone no ouvido, faziam de conta que bebiam do copo. Em seguida, Gislaine encapou as caixas com materiais de texturas diferentes e os pequenos também puderam investigar sensorialmente. Segundo Ana Paula, propostas como essas, que a princípio parecem comuns, são importantes. "É um trabalho simples, mas ao mesmo tempo difícil de realizar, por sua delicadeza, já que os contextos de berçário nem sempre privilegiam o movimento, o protagonismo e os tempos das crianças."
Para finalizar a sequência, Gislaine enviou às famílias o livro O Homem Que Amava Caixas (Stephen King, 36 págs., Ed. Brinque-Book, tel. 11/3032-6436, 35,50 reais) e pediu que lessem com os filhos. "A intenção de aproximar os pais é muito boa, porque bebês aprendem muito com os adultos", afirma Adriana. Todas as etapas do projeto foram retratadas em fotos, expostas na creche para toda a comunidade escolar.
1. Preparar as caixas Selecione caixotes de diferentes formas e tamanhos. Encape alguns com papéis coloridos e de diversas texturas. Faça buracos redondos em outros.
2. Incentivar a exploração Disponha os objetos pela sala e proponha atividades em que as crianças possam interagir livremente, criando as próprias brincadeiras.
3. Mediar a aprendizagem Prepare, também, propostas em que o papel do adulto é importante. Entregue uma caixa com buracos, por exemplo, e peça que tentem colocar diferentes bolas dentro.
4. Envolver as famílias Planeje atividades que possam ser feitas em casa, com os pais. Envie caixas a eles com sugestões de brincadeiras.
Crédito: Arquivo pessoal/Gislaine Carla Pilz Stoeberl
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