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Jornalismo

Gestão escolar: 10 dúvidas de diretores escolares sobre o retorno às atividades presenciais

Selecionamos as principais perguntas dos nossos leitores e conversamos com três diretores para respondê-las

PorAline Naomi

26/07/2021

Crédito: Getty Images

A pandemia foi um período desafiador para os profissionais da Educação, que buscaram formas de garantir a aprendizagem de crianças e adolescentes de forma remota durante a crise sanitária da covid-19. Com o aumento da retomada das aulas presenciais, os educadores vivem outros desafios. Sobretudo para quem está à frente da escola: o diretor ou a diretora.

Pensando em ajudar os gestores escolares, selecionamos as 10 dúvidas mais comuns entre nossos leitores. Para respondê-las, conversamos com Eliana da Costa, diretora da Escola Estadual Profª Minervina Sant'Anna Carneiro em Lins (SP), Lúcia Cristina Santos, diretora da Escola Municipal Profº Waldir Garcia em Manaus (AM) e José Marcos Couto Júnior, diretor da Escola Municipal Professora Ivone Nunes Ferreira no Rio de Janeiro (RJ). Confira:

1. Qual é o papel do diretor no retorno seguro à escola?

Para Eliana, o papel central do diretor é organizar a escola para o retorno às aulas presenciais, tanto na parte estrutural, quanto a emocional. “Na parte física, temos que garantir que todos os protocolos exigidos realmente aconteçam. Temos que verificar os insumos e se tem a quantidade necessária de máscaras, o álcool em gel, os sabonetes, as condições físicas do banheiro. Isso é diário”, explica.

A gestora designou uma funcionária da equipe de serviços gerais para ser a responsável por fazer essa checagem. Ainda assim, ela ressalta que é importante acompanhar essa vistoria. “O gestor não pode ser aquele que fica dentro da sala dele. Tem que ser um gestor ativo. Para mim, um gestor presente é aquele que caminha pela escola todos os dias”, ressalta.

Além do que é oferecido pela secretaria, Eliana contou também com o apoio de parceiros da cidade. Da companhia de saneamento básico, conseguiu garrafas de água para cada aluno ter a sua, e de uma empresa de Equipamentos de Proteção Individual (EPI), conseguiu uma doação de máscaras para os alunos.

Em relação ao socioemocional, Eliana destaca a importância do diretor ter um olhar especial para o acolhimento da equipe escolar, os alunos, famílias e comunidade escolar.

2. Como organizar e preparar a escola para ter um retorno seguro?

José Marcos explica que a organização para o retorno às aulas presenciais começa com entender os direcionamentos das secretarias de Educação. A partir daí, é possível definir e organizar o escalonamento dos alunos. “Tem algumas escolas no município do Rio de Janeiro que até hoje não abriram. Tiveram outras que começaram a abrir a partir de março”, exemplifica o diretor.

O segundo passo é compreender os protocolos de segurança e comunicá-los a toda a comunidade escolar. É possível contar com pessoas de cada grupo — professores, funcionários, alunos e responsáveis — para ajudar na fiscalização, ou criar projetos de conscientização, para que os protocolos sejam seguidos dentro e fora da escola.

O diretor ressalta também a importância de trabalhar essa comunicação cotidianamente para que as pessoas internalizem as informações. “É parecido com o que acontece com a máscara: muita gente para de utilizar depois de um tempo porque cansa daquela medida, mas o cuidado dentro da escola só funciona se tivermos uma consciência coletiva”, conta.

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3. Como conversar e apoiar os professores sobre o retorno?

“Onde não tem o acolhimento, tem o adoecimento”, começa respondendo Lúcia. A gestora conta que a equipe voltou muito insegura, sobretudo com o número de mortes e com as crises que Manaus enfrentou. Por isso, é fundamental acolher os professores, deixá-los expressar seus sentimentos e passar segurança para eles, mostrando que a instituição está seguindo todos os protocolos.  

Para fortalecer o apoio dado aos docentes, Lúcia buscou a parceria com Papo com Zero, grupo de psicólogos voluntários, para fazer rodas de conversa com os professores semanalmente. Se alguém precisasse, poderia fazer uma sessão individual. “Voltamos com esse trabalho psicológico, esse acompanhamento, e a partir daí mostramos o quanto a escola estava se preparando e seguindo todos os protocolos de saúde para voltarmos em segurança. Acho que isso é fundamental”, pontua a diretora.

4. Como conscientizar as famílias e alunos sobre a importância do uso de máscaras?

Eliana relata que percebeu as famílias e os alunos bem conscientes sobre a importância do uso de máscaras. “O ponto forte da escola é a comunicação. Aqui usamos uma agenda própria, o Instagram, o Facebook e enviamos bilhetes”, explica.

Na escola de Lúcia, em Manaus, a comunicação e a informação também são fundamentais. Lá, uma enfermeira da Unidade Básica de Saúde (UBS) deu palestras com orientações para a escola. Além disso, houve também campanhas de conscientização com vídeos e tutoriais. Em uma delas, a escola arrecadou tecido e pediu ajuda das famílias para costurarem máscaras de pano a serem distribuídas a alunos que não tinham uma.

Lúcia reforça que essas iniciativas precisam estar presentes na rotina, e não serem apenas eventos pontuais. “Esse trabalho de conscientização tem que ser com a escola e a família sendo muito parceiras, e é todo dia”, afirma.

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5. Como lidar com a resistência da equipe ao retorno presencial?

Na escola em que José Marcos atua, não houve resistência. “Pelo contrário, até os professores queriam voltar porque o ensino remoto foi muito penoso. Tivemos um retorno das atividades por parte dos alunos muito menor do que se esperávamos”, compartilha o gestor. Ainda assim, é compreensível que muitos sejam resistentes às aulas presenciais por conta das perdas e da insegurança.

Novamente, é importante que a gestão da escola informe sua equipe de docentes sobre todos os protocolos sanitários adotados para que o espaço da escola seja entendido como seguro. Porém, é necessário entender que isso não depende apenas do diretor. “Tanto em um contexto geral, quanto no território, passa pela conscientização e criação de uma cultura para as pessoas se cuidarem, por políticas públicas e pela questão da vacinação e diminuição do número de casos”, lista o diretor.

6. No caso de ser identificado contágio na escola, qual é o protocolo?

Lúcia explica que se uma pessoa não estiver se sentindo bem, ou tiver algum sintoma de covid, o protocolo é afastá-la e encaminhá-la para a testagem. A enfermeira citada anteriormente, que também compõe o comitê anti-covid da escola, faz o acompanhamento. A pessoa só pode retornar à escola se o teste der negativo.

A Secretaria Municipal de Educação de Manaus disponibiliza uma plataforma, o Sistema de Monitoramento de Saúde da Educação (Simsed), em que é possível registrar os casos suspeitos e casos confirmados da doença. Plataformas semelhantes existem em outras redes de ensino, como a do estado de São Paulo. Em caso positivo da doença, deve-se seguir as orientações dadas pela secretaria responsável.

7. Como ajudar os professores a motivar os alunos para que engajem nas aulas?

Para Eliana, o gestor deve incentivar os professores a acolher os alunos e engajá-los nas atividades. “Acho que isso é um ponto fundamental nesse momento, estimular esse educador, exemplificar para ele como tem que ser. Se ele ver que você está sendo acolhedor, ele acaba se engajando nesse trabalho”, comenta.

A gestora pontua também que, a depender da faixa etária, é importante que o professor conte com a ajuda das famílias. “Quando você trabalha com Anos Finais ou Ensino Médio, tem que contagiar apenas o aluno. Quando você trabalha com Anos Iniciais, é diferente. A família tem que estar envolvida, então o acolhimento não é só com o aluno”, explica.

Outra dica é promover momentos de troca entre a equipe docente, para que eles compartilhem suas experiências e o que tem dado certo. Na escola em que atua, Eliana comenta que esses momentos são feitos semanalmente e que todos são estimulamos a participar. “Todos eles têm algo de bom a oferecer, então cada um tem que ter uma participação”.

Por fim, a partir de sua experiência, Eliana percebe que o uso da gamificação e a participação em olimpíadas podem ajudar no engajar os alunos. “É uma maneira de captar esses alunos e fazer com que eles estejam envolvidos nas atividades”.


8. Quais os caminhos para recuperar as aprendizagens que ficaram para trás? Como orientar os educadores?

“Eu acho que essa é a pergunta de um milhão de dólares”, brinca José Marcos. Para ele, as turmas serão mais heterogêneas do que já eram antes da pandemia, então não adianta pensar em uma “fórmula mágica” que seja aplicável a todos os alunos. “Penso que vamos precisar ter um olhar muito focal para alguns alunos específicos e criar estratégias de ensino e de avaliação nos projetos e no cotidiano”, explica.

Ele ressalta alguns pontos importantes: fazer uma recuperação paralela, acompanhar de perto os alunos que não conseguiram realizar as atividades escolares e buscar o apoio e parceria das famílias. Tudo isso com muita empatia. “Se a escola entender isso e criar estratégias para recuperar esse aluno de maneira coletiva, com a família, acho que estaremos no caminho”, conclui.

9. Qual o papel do diretor no acolhimento da comunidade escolar?

Além do acolhimento dado à equipe docente, houve também um processo de acolhimento com o restante da comunidade escolar de Lúcia. O atendimento psicoterapêutico oferecido aos professores também foi disponibilizado para os alunos. A ideia é oferecê-lo também às famílias para que todos possam se expressar e falar sobre seus sentimentos.

Para marcar esse momento, as conversas em grupo têm um mural dos sentimentos. Haverá também uma “ata amorosa” por turma, que resultará em um projeto de artes por classe, a ser exibido no final do ano a toda a comunidade escolar.

O fundamental é mostrar que a prioridade da escola são as pessoas. “Temos que ter essa preocupação [com as aulas] porque temos um currículo a seguir, mas, neste momento, as pessoas são mais importantes”, comenta Lúcia. “Estamos aqui nos bastidores cuidando de tudo. É um acolher com muito carinho, muito cuidado e muita flexibilidade.”

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10. Como fazer o acompanhamento pedagógico durante a pandemia?

Junto ao coordenador pedagógico, o diretor também deve apoiar e acompanhar o trabalho dos professores. Na escola de Eliana, o alinhamento pedagógico é feito da seguinte forma: mensalmente, o coordenador pedagógico pega dois ou três cadernos da turma para verificar, ou vai assistir a uma aula para ver se aquilo que foi proposto na rotina semanal de aulas está acontecendo na prática. O objetivo não é cobrar que o professor cubra todos os tópicos, mas entender como as aprendizagens essenciais estão sendo trabalhadas.

Assim como José observou, Eliana traz a questão da heterogeneidade dentro de uma mesma turma. “O professor tem que diagnosticar, avaliar e ver aquilo que é essencial para o aluno prosseguir e dar continuidade às atividades”, pontua a diretora.  

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