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Jornalismo

De "baderneiros" a parceiros no fim de ano

Telma Vinha comenta os desafios da Educação moral.

PorNOVA ESCOLA

07/12/2016

Telma Vinha,

Telma Vinha,
Professora de Psicologia Educacional da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).

Tratar de problemas de convivência, sabemos, não é fácil. A solução requer planejamento sistemático, tempo e coerência com os valores que regem a escola. E isso até o último dia do ano letivo. Vou contar um caso real: num renomado colégio, os estudantes seguem uma tradição. Durante uma semana de comemorações no fim do período letivo, os alunos do 3° ano celebram o encerramento do Ensino Médio, mas acabam extrapolando. Gritam ofensas aos professores, zombam dos colegas de outras séries, bloqueiam a rua e provocam brigas numa escola vizinha. São atitudes que não condizem com os valores da instituição: justiça, respeito, confiança e autonomia.

O que fazer diante de uma situação assim, que viola os princípios da escola e de uma convivência respeitosa? O primeiro impulso é coibir. Foi o que alguns profissionais de lá propuseram. Uns sugeriram o fim do evento, outros punições severas aos "baderneiros". Mas essas estratégias, além de não agirem na causa do problema, não estavam em linha com os valores da escola. Houve outra opção. Com o apoio da direção, educadores que estudavam o desenvolvimento moral e os conflitos como forma de aprendizado iniciaram o ano seguinte planejando ações sistemáticas que colocavam o diálogo, a confiança e a corresponsabilização como pilares da organização das comemorações.

Ações planejadas combatem brigas e zombaria nos rituais do fim de ano letivo.

Os funcionários receberam formação sobre características dos adolescentes, comunicação construtiva, regras negociáveis e inegociáveis, pro- blemas de convívio e intervenções. Os alunos foram mais envolvidos na preparação da semana. Cada turma de formandos elegeu representantes para fazer parte da comissão que planejaria o evento junto com docentes e orientadores educacionais. O grupo se reunia periodicamente e os alunos colaboravam com a pauta dos encontros. Depois, os assuntos eram debatidos por eles com as classes e as considerações levadas para a próxima reunião. Foram discutidos os episódios anteriores, as consequências, a responsabilidade coletiva e individual e as punições usadas pela escola. Então, firmou-se um acordo: a instituição se comprometeu a não agir de modo coercitivo e a confiar nos alunos enquanto eles asseguraram ser respeitosos e não causar transtornos. 

Na semana comemorativa, o canal de diálogo estava aberto. No caso de posturas autoritárias de adultos ou abusos dos estudantes, os representantes se reuniam com a comissão e os encaminhamentos eram compartilhados com os alunos pelo WhatsApp. Assim, evitava-se a disseminação de mal-entendidos e eventuais erros eram reconhecidos. Se alguém agia de modo desrespeitoso, a orientação conversava individualmente e relembrava os acordos. Apesar de incidentes isolados, a celebração foi harmônica e ninguém foi punido.

Os valores de uma escola não são os almejados, mas aqueles presentes no cotidiano, e as tradições podem ser transformadas. Isso é construído com ações educativas planejadas e cooperativas.


Ilustração: Adriana Komura

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