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Jornalismo

Estude sorrindo: você está sendo filmado

Instalar câmeras de segurança não pode ser a saída para resolver problemas de comportamento. Entenda por quê.

PorWellington SoaresElisa Meirelles

06/03/2018

Câmeras na escola. Ilustração: Vilmar Oliveira

No dia 25 de setembro, 107 alunos de um colégio particular da capital paulista foram suspensos por ter se recusado a voltar para a aula depois do intervalo. A ação dos estudantes, segundo o que foi noticiado por Veja.com, seria uma forma de protesto contra as câmeras de segurança que haviam sido instaladas nas salas. O acontecimento toca em questões comuns ao cotidiano escolar: o combate à violência, o tratamento dado à indisciplina e maneira como as decisões são tomadas.

Instalar câmeras ou lançar mão de outros mecanismos parecidos, como a presença de policiais armados, são ações que podem até inibir o mau comportamento por algum tempo, mas não se sustentam, pois não ajudam a conscientizar os alunos. Se não há diálogo e reflexão dentro da escola, é bem provável que esses jovens mantenham o mau comportamento fora dela, quando não estiverem sendo filmados - e onde não haverá oportunidade de construir aprendizados com base em seus atos. "Perde-se, então, a chance de favorecer a autorregulação do comportamento, tão necessária para se conviver em sociedade", explica Adriana Ramos, coordenadora do Grupo de Estudo e Pesquisa em Educação Moral (Gepem), da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).

Além disso, a implantação de recursos de vigilância pode criar um clima de desconfiança, distante do que seria o ideal em uma instituição de ensino. Em um ambiente pautado pela coerção, não é possível formar adultos críticos e com autonomia. A escola é um dos principais espaços nos quais os alunos aprendem a se relacionar e começam a entender as consequências de seus atos. Se barrarmos toda manifestação pessoal, não ofereceremos a eles a chance de aprender com suas ações.

É claro que existem exceções: a instalação de câmeras pode ser eficiente de maneira pontual e em situações extremas, em que são necessárias respostas rápidas - quando o tráfico de drogas se faz presente dentro da escola, por exemplo. Contudo, a medida deve vir acompanhada de ações educativas, com o objetivo de refletir sobre o problema para solucioná-lo a médio e longo prazo. Por isso, é fundamental que tais ações sejam planejadas com a mesma seriedade que os outros projetos do colégio.

O caso da escola paulistana também nos leva a debater a maneira como as decisões são tomadas. Consultar o Conselho Escolar e informar toda a comunidade - professores, funcionários, pais e alunos - sobre as decisões são etapas que não podem ser puladas.

Por fim, é necessário que os gestores acreditem no diálogo como a melhor via para solucionar os problemas: se alunos ou professores se sentirem violados, é necessário ouvi-los, entender o porquê da sensação e expor os motivos que guiaram a decisão. "Se as manifestações dos estudantes entrarem em confronto com o regimento da escola, é preciso esclarecer a eles as regras e as punições a que podem ser submetidos. E tentar, mais uma vez por meio do diálogo, encontrar uma solução", comenta Maura Barbosa, consultora pedagógica de Gestão Escolar.

Além de serem comuns no ambiente escolar, os problemas de comportamento podem gerar grandes oportunidades para se construir aprendizado sobre as relações sociais. Por isso, a melhor solução é sempre aquela que só poderia ter sido tomada dentro da escola, o que não envolve medidas de regulação como a instalação de câmeras de segurança.

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