Não é raro que os alunos questionem a nós, professores, o motivo pelo qual têm que estudar alguns tópicos de Matemática. Quando o assunto é porcentagem, a resposta, em geral, é imediata: basta citar inúmeras situações cotidianas em que esse cálculo se faz presente e fica justificada a abordagem no contexto escolar. Porém, dependendo do conteúdo, responder a essa pergunta recorrente usando a mesma estratégia pode ser muito mais difícil, se tentarmos, por exemplo, indicar a situação cotidiana que exige a resolução de uma equação de segundo grau com a aplicação da fórmula de Bháskara.
Mas o tema exige cuidado: a pergunta normalmente é feita por alunos desmotivados – no sentido literal, que não veem motivo para aprender – e desinteressados. E tornar um assunto interessante tem mais a ver com trazer novos significados para o conhecimento do que com a possibilidade de mostrar suas aplicações práticas.
Com a chegada da Base Nacional Comum Curricular (BNCC), esses significados se tornam mais aparentes: o que antes constava dos planos curriculares como equação quadrática é traduzido como a habilidade de “compreender os processos de fatoração de expressões algébricas, com base em suas relações com os produtos notáveis, para resolver e elaborar problemas que possam ser representados por equações polinomiais do 2º grau”.
O texto da habilidade foca na compreensão de que há formas de encontrar o valor de uma incógnita partindo-se das relações com outros conhecimentos prévios, usando-os sempre que o valor buscado puder ser modelado por uma equação polinomial do 2º grau. Nota-se, com isso, que saber usar a fórmula de Bhaskara não é tão significativo quanto perceber que, ao longo da história, os matemáticos encontraram uma sequência repetida de passos que podia resolver uma quantidade muito grande de problemas e ainda ser representada simbolicamente por uma única expressão algébrica.
A matemática, pelo viés da BNCC, não é só um manancial de números, operações e formas geométricas: é, também, um jogo, uma linguagem, uma forma de ver e modelar realidades, uma estrutura de pensamento, um exercício criativo e um campo de desenvolvimento de múltiplas habilidades. Pode ser que nem sempre as aplicações sejam práticas, mas certamente essa nova visão torna seus conteúdos muito mais interessantes.
O texto introdutório do eixo deixa claro que o conhecimento matemático é essencial não só por sua aplicabilidade, mas também por sua potencialidade na formação de um cidadão crítico, autônomo e ativo na sociedade. Os jogos de estratégia, os desafios lógicos e os problemas que exigem soluções não tradicionais são exemplos de situações que despertam as habilidades matemáticas para além dos contextos sociais e de seus usos, sem cair necessariamente no formalismo. O gosto pelos desafios, se despertado, pode ser muito mais útil, em campos diversos, com benefícios incontáveis para a sociedade como um todo.
Rodrigo Blanco é professor, formador e editor de livros didáticos, mentor e revisor do Time de Autores da Revista Nova Escola