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Jornalismo

Quem são os novos alunos, os nativos digitais

Como planejar a aula para envolver essas crianças; o significado da identidade virtual; o que eles (e os pesquisadores) dizem sobre sua relação com a internet

PorNOVA ESCOLAAna GonzagaPaula Nadal, Rodrigo Ratier

27/09/2016

#panorama

Curti!

"Eu uso o computador para aprender desde a creche. Minha professora leva a gente ao laboratório de informática para fazer atividades e para jogar. Também assistimos a filmes e ouvimos músicas. A aula fica muito mais interessante assim. Em casa, também uso todos os dias e até entro na internet. Gosto de fazer pesquisas e a professora diz que isso é legal. Mas temos de tomar cuidado com os sites que serão usados."
Allana Regina Artiaga Mota, 6 anos, aluna do 1º ano da EE Desembargador Gabriel Pinto de Arruda, em Cáceres, a 214 quilômetros de Cuiabá.

 

Uma pergunta

Qual é a principal diferença na maneira como os professores e os alunos veem a tecnologia?
Os professores, geralmente, a enxergam apenas como um novo modo de fazer coisas antigas. E os alunos a veem como uma oportunidade de fazer coisas totalmente novas. Para os adultos, é uma ferramenta, para as crianças é a fundamentação de tudo o que fazem.
Marc Prensky, escritor norte-americano, autor do livro Teaching Digital Natives (Ensinando Nativos Digitais, sem tradução para o português).

 

Do sapiens ao zappiens

Sempre conectado
Os pesquisadores holandeses Wim Veen e Ben Vrakking batizaram a geração que já nasce conectada de Homo Zappiens. No livro Homo Zappiens: Educando na Era Digital (140 págs., Ed. Artmed, tel. 0800-703-3444, 40 reais), eles esclarecem que o comportamento aparentemente caótico de zapear de um canal para outro da TV e de navegar na internet não é perda de tempo. Essas atitudes são a expressão da habilidade de selecionar informações rapidamente, executar múltiplas tarefas e desenvolver um comportamento não linear. É assim que eles se relacionam com o mundo e também aprendem.

 

Onde os brasileiros acessam a internet

  • 57% em casa
  • 35% em lanhouses
  • 31% no trabalho
  • 20% na casa de amigos
  • 18% na escola
  • 5,5% em locais gratuitos
Fonte Mapa da Inclusão Digital 2012, do Centro de Políticas Sociais da Fundação Getulio Vargas (FGV) e Fundação Telefônica

 

E entre as crianças*...

  • 51% já utilizaram um computador
  • 27% já acessaram a internet
  • 25% já perceberam perigo na rede

 

O que elas fazem na rede

  • 90% brincam com jogos
  • 45% pesquisam para a escola
  • 34% assistem a desenhos e vídeos

*Entrevistas com 2.516 crianças de 5 a 9 anos. Fonte Pesquisa TIC Crianças 2010, cgi.br

#planejamento

Radiografia de um nativo digital

  • Socialização O ciberespaço integra seu cotidiano. É nele que compartilha suas histórias e os conhecimentos adquiridos.
  • Foco Se concentra no que lhe interessa. Caso tenha um videogame por perto, o restante fica sem atenção.
  • Rapidez Acostumado a encontrar informações rapidamente e a acessá-las de maneira fragmentada.
  • Vários rumos Em vez de um único projeto de vida, possui vários planos a curto e médio prazos, de diferentes naturezas.
  • Leitura Lê menos livros, mas 80% de suas ações na internet envolvem leitura, o que também rende intimidade com o inglês.
  • Multitarefas Com a tecnologia, executa mais de uma tarefa ao mesmo tempo. É capaz de ler e ouvir música, por exemplo.
Consultoria Julio Cesar Araújo, da Universidade Federal do Paraná; e Samantha Kutscka. Fonte Psicologia da Educação Virtual (César Coll, Carles Monereo e colaboradores, 368 págs.,Ed. Artmed, Tel. 0800-703-3444, 73 reais)

 

Passo a passo

Como dar uma aula tecnológica para esse novo aluno

  • 1 Preparação Planeje bem a aula, com propostas consistentes. E, quando possível, estabeleça uma produção final resultante do uso da tecnologia.
  • 2 Participação Torne o conteúdo mais interessante que o computador, envolva os alunos e estimule o debate sobre os temas.
  • 3 Organização Quando o ambiente permitir, organize as carteiras em forma de "U", com os alunos voltados para a parede. Assim, você terá a visão de todas as telas.
Consultoria Maristela Aparecida Iope de Alcântara, Marc Prensky e Milena Campello, Pós-graduada pela Faculdade do Pantanal (Fapan)

 

Uma pergunta

O que fazer para ganhar a atenção da turma?
O professor precisa mudar sua postura em sala. Em vez de dar uma palestra, você deve fazer com que os alunos resolvam problemas, pois só assim eles vão manter a atenção no conteúdo. O computador também te libera de fazer grandes explanações. Além disso, os equipamentos encorajam os estudantes a descobrir as coisas sozinhos e a colaborar entre si.
Don Tappscot, pesquisador canadense, autor de A Hora da Geração Digital (448 págs., Ed. Agir, tel. 21/3882-8200, 69,90 reais).

 

Palavra da especialista

"É equivocado achar que os alunos sabem mais que os professores sobre tecnologia. Os jovens conhecem muito bem as técnicas, mas não têm a noção do potencial das novas ferramentas. Cabe ao educador orientá-los nessa descoberta."
Maristela Aparecida Iope de Alcântara, diretora do Centro Digital de São Caetano do Sul, na região metropolitana de São Paulo.


#ferramentas

A identidade na era digital
A vida social dos nativos digitais online é tão ou até mais importante que aquela que ocorre presencialmente. No mundo virtual, eles contam suas preferências, fortalecem relações e organizam eventos. Diante disso, há uma identidade que se constrói no universo digital e é representada por textos, imagens e outros conteúdos apresentados nas interações.

 

Palavra do especialista

"Usar avatares é uma proposta pedagógica inovadora e bastante interessante. O avatar apresenta a possibilidade de se relacionar em outros mundos, proporcionando o exercício de criatividade na definição do personagem e a interação com outros indivíduos. Ele permite que o aluno seja protagonista nas ações e isso pode ser especialmente interessante para os tímidos."
Vicente Willians Nunes, coordenador do Núcleo de Tecnologia Educacional do Colégio Cruzeiro, no Rio de Janeiro.

 

Bom para...

  • criar um avatar falante

Voki - grátis
Permite criar avatares que falam e gravar textos a serem ditos por ele. Pode ser usado por você, a fim de passar uma tarefa para a turma. É bastante útil para docentes de Língua Estrangeira. Em inglês.

  • criar um avatar estático

DoppelMe - grátis
Possibilita a escolha das características físicas que lhe representam e o uso da imagem final no AVA ou no e-mail. Pode-se, ainda, criar uma imagem que represente a classe toda. Em inglês.

 

Curti!

"Foi muito divertido criar um avatar. Escolhi uma menina com o estilo caubói. No começo, ela não era parecida comigo. Então, troquei a cor do cabelo e mais algumas coisas. Aí ficamos até parecidas, ainda mais depois que gravei a voz e ela passou a falar como eu. Mostrei para todo mundo em casa, e até tentei criar um avatar novo fora da escola. Gosto muito de ficar no computador, brinco desde os 5 anos. O que mais gosto é do jogo em que uma menina tem de decifrar mistérios e resolver charadas. Eu também mudei um pouco o rosto dela para que ficasse mais parecida comigo. Além de jogar, converso com meus amigos e faço pesquisas da escola na internet."
Isabela Caldete de Lima*, 9 anos.

"Criei meu primeiro avatar no ano passado. A professora levou a gente para a sala de informática e ensinou como tinha de fazer. Foi muito divertido. Meu avatar é um cara de cabelo azul, não parece muito comigo. Mas o mais legal é que ele fala como eu, e ficou em um lugar da internet onde todo mundo pode ver. Neste ano, estamos fazendo uma coisa diferente na aula de informática. A professora está ensinando sobre os índios brasileiros e a gente usa a internet para pesquisar. Gosto muito de computador, fico mais ou menos uma hora por dia em casa, principalmente jogando e conversando com meus amigos."
João Pedro de Arruda*, 8 anos.

* Alunos do 3º ano da Escola Moppe, em São José dos Campos, a 102 quilômetros de São Paulo, participaram da atividade desenvolvida pela professora Ana Paula Costa Souza em 2011.

#futuro

O que as crianças pensam

Facilidade
"Uso o computador para ver vídeos e jogar. Também, costumo pesquisar coisas da escola e outros temas que me interessam. Lembro que queria fazer uma aranha de garrafa PET. Eu não sabia como era, então fui buscar na internet e aprendi. Tecnicamente, não dá para fazer os trabalhos do colégio sem usar a internet. Mas na vida, até dá para ficar sem ela."
Renan Calliyeris Capelo, 9 anos, aluno do Colégio Miguel de Cervantes, em São Paulo.

Agilidade
"Dá para fazer tudo na internet! Imagina se ela não existisse? A gente teria de escrever cartas todos os dias e esperar o correio entregar. E para pesquisar, então? Seria muito mais difícil encontrar as informações."
Wagner Palhano da Silva, 10 anos, aluno do CIEP Doutor Adão Pereira Nunes no Rio de Janeiro.

Descoberta
"Tenho computador em casa, mas meus pais não deixam mexer muito. Uso, às vezes, para fazer algumas pesquisas. Na escola, do que eu mais gostei foi do jogo da memória sobre as cédulas. Eu e meus amigos descobrimos sozinhos que dava para aumentar o número de cartas. Jogar faz a gente aprender melhor do que apenas ler no livro."
Vitória de Oliveira Pereira, 9 anos, aluna da EEEFM Carlos Drumond de Andrade, em Cacoal, a 485 quilômetros de Porto Velho.

Divulgação
"Nossa professora criou um blog. A gente escreve as poesias e ela publica. Antes, eu não gostava muito de escrever. Mas, agora, como sei que será publicado e minha família vai ler, até gosto. Faço uma poesia quase todos os dias, e nem vale nota."
Fernanda Sayuri, 9 anos, aluna da EMEF Padre Serafim Martinez Gutierrez, em São Paulo.

 

Palavra da especialista

"Dentro de cinco anos, os alunos deverão ter acesso a todo tipo de tecnologia, incluindo tablets, games de última geração e conexão de internet 3G. No início, os professores vão frear o uso dos equipamentos que não sejam reconhecidamente educativos, mas com o tempo os docentes passarão a explorar essas tecnologias de forma correta e contextualizada. Em dez anos, então, deveremos ter uma escola completamente diferenciada da que existe hoje, onde a tecnologia permita a construção coletiva do conhecimento e a disseminação dele dentro de uma grande rede."
Samantha Kutscka, coordenadora de projetos da Escola do Futuro, da USP.

 

Duas perguntas

Como serão os alunos do futuro?
Espero que eles sejam pessoas criativas, abertas e colaborativas, sujeitos ativos na geração de conhecimento. Para isso, devem ser capazes de planejar e realizar projetos, navegando de maneira responsável num ambiente com imensa quantidade de informação disponível, como é a internet. Cabe à escola preparar o aluno para a colaboração criativa dentro dessa rede.

E como essa preparação pode ser feita?
Devemos conversar com os alunos para que eles percebam que quando temos um objetivo de aprendizagem precisamos usar o computador de maneira consciente: saber quando ligá-lo, como utilizá-lo sem desviar-se do foco e desligá-lo ao fim da tarefa.
Pierre Lévy, filósofo francês especialista em TIC.

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