O que fazer quando não há diálogo na escola
Cada vez mais pessoas usam as redes sociais para denunciar os problemas das escolas. Se esse não é o melhor caminho, o que deve ser feito?
06/03/2018
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Jornalismo
06/03/2018
A foto de uma sala de aula alagada, na qual alunos estudam com guarda-chuva devido às goteiras no telhado, fez com que o município de Imperatriz, com menos de 250 mil habitantes e a 556 quilômetros de São Luiz (MA), ganhasse visibilidade no noticiário e nas redes sociais. A foto, publicada em 12 de outubro pela professora Uiliene Araújo Santa Rosa, do Colégio Municipalizado Guilherme Dourado, teve milhares de compartilhamentos. Por conta desse episódio, ela chegou a ser demitida, o que ampliou ainda mais a repercussão do caso.
A professora não é a primeira a reclamar nas redes sociais sobre a precariedade das instalações de estabelecimentos de ensino no Brasil. Há pouco mais de dois meses, a aluna Isadora Faber, de Florianópolis, alcançou grande repercussão no Facebook ao se queixar dos problemas da sua escola. Mas será que as redes sociais são o melhor caminho para fazer denúncias como essa? Ou, primeiro, é preciso buscar uma solução em outras instâncias? E se o problema não for resolvido, o que fazer?
Na avaliação, da professora e deputada federal Maria Auxiliadora Seabra Rezende (DEM), que já presidiu o Conselho Nacional de Secretários de Educação (Consed), houve uma sequência de erros e negligência por parte da direção da escola, que tinha, ou deveria ter, conhecimento do problema. "É inadmissível que os estudantes permaneçam em uma sala de aula naquelas condições."
No entanto, ao analisar o caso, Dorinha, como é conhecida, considera que tanto a atitude da professora Uiliene, quanto da secretaria foram extremas. "A demissão foi uma atitude autoritária. O professor não pode se calar", defende. Ao mesmo tempo, Dorinha acredita que a professora poderia ter tomado outras medidas antes de publicar a foto no Facebook.
Quando casos como esse ocorrem, o primeiro passo é levar problema para a equipe gestora, a fim de que a denúncia seja encaminhada às redes de ensino, que devem garantir que os alunos tenham espaços adequados para estudar. Se não há abertura para diálogo no local de trabalho, o próprio professor pode fazer as denúncias e acionar a diretoria regional de ensino, o secretário, o Ministério Público, a Defensoria Pública e também os Conselhos Municipais e Estaduais de Educação. "É possível que essas instâncias resolvam o problema sem gerar tanto estresse. No entanto, nada deve impedir que, em um momento extremo, alguém possa recorrer à imprensa ou às redes sociais", defende Dorinha. "Ninguém pode ser punido por expressar a posição pessoal. Todos têm direito a falar, e, como qualquer pessoa, assumir as consequências de sua fala", conclui.
Em entrevista a NOVA ESCOLA, a professora Uiliene afirma que não há uma gestão participativa no Colégio Municipalizado Guilherme Dourado. "Lá não há diálogo com os gestores." Questionada se publicaria novamente a foto ou se procuraria outras instâncias para fazer a denúncia, ela não soube dizer se faria tudo de novo. "Fiquei indignada com a situação dos meus alunos. Não acho que cometi um erro ao publicar a foto. Senti-me censurada e retaliada, queriam tirar meu direito à liberdade de expressão", lamenta ela.
Parece descabido que professores possam ser demitidos por expressar sua opinião. Eles são protagonistas no processo de ensino e aprendizagem e precisam ter voz no debate. Recorrer à internet não é a melhor nem deve ser a primeira opção, mas secretarias e outros órgãos de controle e fiscalização precisam ser mais ágeis na resolução dos problemas. Para tanto, é fundamental manter abertos os caminhos institucionais para o diálogo, facilitando que os problemas sejam resolvidos no âmbito da própria rede. Isso é ainda mais urgente numa época em que a difusão de informação está cada vez mais descentralizada com as redes sociais e o uso da tecnologia, criando a falsa ilusão de que as dificuldades podem ser resolvidas em um clique, sem percorrer as rotas que levam ao fortalecimento das instituições democráticas.
Felizmente, a Secretaria Municipal de Educação voltou atrás, suspendeu a demissão de Uiliene. Segundo a professora, foi aberto um processo administrativo para investigar o caso. Procurada pela redação de NOVA ESCOLA, a direção do Colégio Municipalizado Guilherme Dourado não quis comentar o caso. Até o fechamento deste texto, a secretaria - também procurada pela revista - não havia se manifestado.
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