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Jornalismo

Do tempo da carochinha

Brincadeiras antigas animam a turma,melhoram as aulas e ajudam a resgatar a cultura popular

PorPriscila Ramalho

01/11/2000

Crianças do Barão de Mauá brincam de Cabo-de-guerra: tradição conservada. Fotos Masao Goto Filho
Crianças do Barão de Mauá brincam de Cabo-de-guerra: 
tradição conservada. Fotos Masao Goto Filho  

Lembra do tempo em que as ruas se transformavam em palco para jogos de amarelinha, peteca, pião, bola de gude, cabo-de-guerra, futebol de pregos? Com o crescimento das cidades, eles perderam lugar para os carros, mas (felizmente) não deixaram de existir. Em pelo menos duas escolas uma em Mauá, na Grande São Paulo, e outra no Rio de Janeiro continuam divertindo as crianças, além de servir como material pedagógico nas aulas de Educação Física e Língua Portuguesa.

No Colégio Barão de Mauá, na cidade de mesmo nome, a professora Mirlene Marchetto Gomes desenvolveu um projeto com as turmas de 8a série para recuperar o gosto pelas brincadeiras populares. "Achei importante abordar esse assunto com adolescentes, que estão naquela fase de recusar tudo o que é relacionado ao universo infantil", justifica. Os alunos fizeram um levantamento sobre jogos de rua a partir de jornais, internet e, principalmente, conversas com pais, avós e vizinhos e ensinaram as turmas de 1a a 4a série tudo o que aprenderam.

"Esse tipo de trabalho é importante para que as tradições não caiam no esquecimento", aprova o professor João Batista Freire, da Universidade Estadual de Campinas, Unicamp. Ele explica que uma parte considerável da educação dos pequenos deveria se dar na rua, pulando amarelinha ou jogando taco com os vizinhos. A descaracterização desse espaço de lazer nos grandes centros gera um vazio, que pode ser preenchido pela escola.

Wilson ajuda aluna a se equilibrar na perna-de-pau: coordenação motora Foto: Fernanda Mayrink
Wilson ajuda aluna a se equilibrar na perna-de-pau: coordenação motora. Foto: Fernanda Mayrink

"Existe um vasto mundo de cultura infantil que ainda é pouco aproveitado como conteúdo escolar", concorda Tião Rocha, presidente do Centro Popular de Cultura e Desenvolvimento, de Belo Horizonte. "Já está mais do que provado que as manifestações lúdicas desempenham funções muito importantes no desenvolvimento da criança." Por meio dos jogos é possível exercitar a imaginação, estimular a independência e a espontaneidade, promover o convívio em grupo e desenvolver habilidades motoras como equilíbrio, força e flexibilidade (leia o quadro).

Além disso, eles podem ser utilizados como um importante instrumento didático para outros fins: "Partindo das tradições infantis, por exemplo, você pode dar uma bela aula de História e de educação patrimonial", explica a pesquisadora Walkyria Mollica do Amarante, do Centro de Cultura e Arte da PUC de Campinas. Exatamente o que aconteceu em Mauá: "A gente tem de conhecer as nossas origens", diz Fernanda Mantoan, 9 anos, uma das alunas da 3a série que aprendeu com os colegas mais velhos.

Peteca moderna

Nem todas as diversões antigas, porém, mantêm o encanto. Para esses casos, o professor de Educação Física Wilson Souza Costa, do Oga Mitá, no Rio de Janeiro, tem uma receita: variar, modificar, inventar. É assim que ele cria o "pega-pega com bola", o "bobinho com peteca", a "amarelinha temática", a "dama humana" e outras novidades. "Muitas vezes a sobrevivência dessas práticas depende de uma adaptação", explica.

Nas suas aulas, os alunos podem pular amarelinha, andar de perna de pau e até subir em árvore uma mangueira de 2 metros de altura plantada no pátio. Seja qual for o jogo, Costa sempre encontra um meio de incorporá-lo ao currículo programático. "A perna de pau trabalha o equilíbrio e a coordenação melhor do que qualquer outra atividade", exemplifica, ressaltando que, sempre que pode, privilegia os brinquedos tradicionais. "A mídia não vende bolinha de gude. Cabe ao professor apresentar esse repertório."

Depois, é só deixar a garotada se divertir, como aconteceu com a turma da professora Mirlene. "Quando souberam que teriam de brincar, eles ficaram meio ressabiados", lembra. No final, todos adoraram inclusive ela, que jogou barra-manteiga, pulou corda e empinou pipa. "É muito mais divertido que ficar na frente do computador", garante João Márcio Trichinato, da 8a série. Quer testar?

Sete razões para brincar

 

 

 

 

 

  

Quer saber mais?

Centro Popular de Cultura e Desenvolvimento, R. Paraisópolis, 80, CEP 31010-330, Belo Horizonte, MG, tel. (31) 463-6357
Colégio Barão de Mauá, Av. da Saudade, 210, CEP 09360-000, Mauá,SP, tel. (11) 7635-5788
Colégio Oga Mitá, R. Maxwell, 194, CEP 20541-100, Rio de Janeiro, RJ, tel. (21) 570-7765Fotos Masao Goto Filho  

 

 

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