Na EE Orestes Guimarães, os alunos participam de oficinas sobre temas ligados à sexualidade, nas quais atividades lúdicas servem de pretexto para discutir assuntos como gravidez e doenças
O entorno da EE Orestes Guimarães, em São Paulo, é muito carente. Parte dos alunos mora em cortiços, onde é preciso pagar 2 reais para tomar banho. Esse universo de dificuldades foi um dos principais desafios enfrentados pelos professores e coordenadores ao implementar o projeto Descobrindo a Sexualidade há dez anos. No início, o programa era voltado a alunos a partir da 7ª série. Mas há quatro anos uma aluna da 4ª serie ficou grávida - e as séries iniciais foram incluídas. "Com os menores, falamos de corpo, menstruação e higiene", diz o vice-diretor, Itamar Aparecido Pereira, que responde pelo projeto ao lado de um conselho de professores. "Temos palestras, produção de cartazes, conversa com os alunos. Não é nada de sofisticado, mas reduzimos em 80% os casos de gravidez na adolescência", afirma o vice-diretor.
O assunto está sempre na pauta do horário de trabalho pedagógico coletivo (HTPC). Em geral, o programa começa nas aulas de Ciências (estrutura do corpo, cuidados com a higiene etc.), mas um dos motivos para o sucesso é o envolvimento de toda a equipe docente. "Em Língua Portuguesa, os jovens produzem textos sobre o assunto. Em Matemática, trabalham dados estatísticos. Em Geografia, analisam a distribuição dos casos de gravidez na adolescência pelo país e assim por diante", conta Pereira. Boa parte do projeto é tocada em parceria com a União Brasileiro-Israelita do Bem-Estar Social (Unibes), organização não-governamental que oferece cursos e atividades aos alunos da escola no contraturno. A professora de Ciências aproveita o material de kits fornecidos por entidades como a Fundação Bradesco para fazer oficinas com os alunos, nas quais são debatidos de forma lúdica temas como a gravidez.
A orientação sexual é um dos cinco temas transversais propostos pelos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) para o Ensino Médio, que sugere abordar o assunto como algo inerente à vida e à saúde, relacionado com o direito ao prazer. Por isso, é importante envolver todas as disciplinas. "Não se trata de uma especialidade, mas de um conteúdo que deve ser discutido em Biologia, Educação Física, Arte", diz Laurindo Cisotto, coordenador pedagógico do Ensino Médio no Colégio Marista Arquidiocesano, em São Paulo, e autor de uma tese sobre a abordagem da sexualidade no ambiente escolar.
"O problema é que muitos professores encaram a sexualidade como algo que não deveria ser falado na escola por acreditarem que o simples fato de discutir abertamente sobre sexo com os estudantes pode contribuir para que eles saiam transando sem pensar", afirma o coordenador pedagógico.
"Falar sobre temas polêmicos como drogas e orientação sexual gera medo entre pais e professores, que temem que a conversa estimule ou contamine seus filhos", reforça o psiquiatra Marcelo Niel, do Programa de Orientação e Atendimento a Dependentes (Proad), da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). Esse temor existe, é inegável, porque conversar sobre sexo (ainda mais com jovens) causa agitação e nervosismo. "Afinal, um adolescente passa muito tempo pensando em coisas ligadas a sexo", completa Maria Helena Vilela, diretora-executiva do Instituto Kaplan, em São Paulo, especializado em projetos de capacitação docente nessa área.
Segundo ela, é essencial os professores perderem o medo de se expor diante dos estudantes. "Não dá para ficar constrangido só porque um menino sofre porque quer saber se tem pênis pequeno." Uma iniciativa do Kaplan, que leva em conta essa necessidade de não expor os professores, é o projeto Vale Sonhar, voltado principalmente para a prevenção de gravidez na adolescência, por meio da capacitação de agentes multiplicadores que trabalham com os alunos em três oficinas: identificação do sonho, nem toda relação sexual engravida e engravidar é uma escolha.
Nessa mesma linha de trabalhar o tema de forma franca com os jovens, o corpo pedagógico do CE Edmundo Peralta Bernardes, em Paty do Alferes, a 131 quilômetros do Rio de Janeiro, desenvolve três projetos: Entendendo a Sexualidade, Gravidez e Doenças Sexualmente Transmissíveis e Prevenção ao Uso de Drogas. "Todos esses tópicos são discutidos entre os professores durante as discussões para a montagem do projeto político-pedagógico e levados para a sala de aula ao longo do ano", conta Maria Costa, diretora da escola. Além de ações mais tradicionais, como palestras e vídeos, a escola conta com o apoio de órgãos públicos. "Contamos com a ajuda de médicos da Secretaria Municipal de Saúde para conversar com os estudantes e de profissionais do Ministério Público para visitar aqueles que têm problemas com drogas e tentar recuperá-los", diz a diretora.
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