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Jornalismo

Prometida por sucessivos governos desde a década de 1990, a despoluição da Baía de Guanabara nunca se concretizou. É verdade que em 2009, quando o Rio de Janeiro foi escolhido como sede das Olimpíadas, o sonho ganhou novo fôlego e foi celebrado como o grande legado socioambiental do evento para a cidade. Mas veio 2016 e pouca coisa mudou. A baía continua a receber 51% do esgoto produzido por 16 municípios sem nenhum tratamento. "A administração estadual chegou a afirmar que 80% da limpeza estaria concluída para os Jogos Olímpicos, mas ficamos longe disso", lamenta Adauri Souza, superintendente do Instituto Baía de Guanabara, que realiza projetos de Educação ambiental.  

A situação gera preocupações sobre a saúde e a segurança dos atletas não só pelo risco de doenças mas também pela quantidade de resíduos sólidos flutuantes que podem até virar os barcos de competição. Esse enrosco pode ser o ponto de partida para turmas de 4º e 5º anos conhecerem melhor as formações litorâneas brasileiras, relacionando os problemas ambientais tanto às características naturais quanto às formas do uso do espaço. No caso da Baía de Guanabara, o fundamental é mostrar como a concentração de sujeira resulta da conformação geográfica da região e da ocupação desordenada de seu entorno. Sueli Furlan, professora de Geografia da USP, propõe uma sequência didática em seis aulas sobre o tema.

Das imagens aos odores

Para começar, apresente aos alunos quatro imagens de diferentes formações litorâneas: o mangue, o estuário, a praia e a baía. Sem dar nomes ou definições, proponha que descrevam as formas que conseguem observar. Em seguida, sugira que os estudantes imaginem os odores que podem ser sentidos, os sons que podem ser ouvidos, os animais e plantas que habitam o lugar e o que o ser humano poderia fazer nessas paisagens (morar, pescar, praticar esportes etc.). A referência teórica que fundamenta essa atividade é o conceito de paisagem geográfica. No livro Metamorfoses do Espaço Habitado (136 págs., Edusp, tel. 11/3091-4008, 26 reais), o geógrafo Milton Santos define-a como "o domínio do visível, aquilo que a vista abarca", mas não para por aí. A dimensão dela é a "da percepção, o que chega aos sentidos", e, portanto, "não é formada apenas de volumes, mas também de cores, movimentos, odores, sons". "Por essa razão, é importante que o aluno tente ir além da visão, mesmo que não possa visitar o local", justifica Sueli Furlan. Anote no quadro algumas palavras-chave com base na fala dos alunos. Após a leitura dos registros em voz alta, consolide uma primeira síntese: nomeie as paisagens e termine apresentando a Baía de Guanabara como o objeto principal de estudo das aulas seguintes.

Além do esgoto,
toneladas de resíduos
sólidos emporcalham
águas e areias do local. Foto: Getty Images

A baía e seus tristes rios 

Distribua alguns dicionários e peça que procurem a definição de "baía" ? reentrância da costa litorânea em que o mar avança sobre o continente. "É importante explorar o verbete explicando o significado dos termos técnicos", ressalta Sueli. Complemente com uma breve fala sobre a Baía de Guanabara propriamente dita, dizendo que ela é um marco importante no Rio de Janeiro, cidade que receberá os Jogos Olímpicos. 

Um recurso útil para esse momento é o Google Earth, que permite aproximar a imagem de satélite e visualizar uma peculiaridade da Baía de Guanabara: as áreas de encontro entre rios e o mar. Mostre uma área como essa e pergunte à turma o que aconteece quando o rio, de água doce, chega ao oceano. Leve os estudantes para a sala de informática e planeje com eles a estratégia de busca na internet. Comece com um levantamento de palavras-chave, deixando que todos deem sugestões. Discuta a pertinência de cada termo ? a ideia é que as buscas revelem a situação de poluição dos rios que deságuam no local. Para completar, peça que cada aluno traga na aula seguinte duas páginas de notícias, imagens ou trechos de livros sobre os rios da baía.



Os rios que desaguam
na baía são canais de
transporte do esgoto da
região metropolitana. Foto: Tomaz Silva/Agência Brasil

Esportes de risco

Divida a turma mais uma vez e peça para que cada grupo produza um cartaz com o material encontrado. Todos podem ficar à vontade para desenhar, escrever e fazer colagens na cartolina. "A atividade permite exercitar habilidades como selecionar informações relevantes e construir legendas", explica a consultora. Com as informações acumuladas e organizadas, é hora de aprofundar os conhecimentos sobre a degradação ambiental e as consequências dela para as Olimpíadas. Para marcar essa etapa, cole os cartazes nas paredes da sala e escreva o tema no quadro: "A poluição na Baía de Guanabara e os esportes aquáticos".

Explique que a baía receberá as competições da vela, um dos esportes aquáticos olímpicos. A intenção, aqui, é mostrar que a água poluída entra em contato com a pele dos atletas e pode haver ingestão do líquido. Se você puder, convide um esportista ou profissional que tenha afinidade com esportes e saúde para uma entrevista sobre o cuidado com a água contaminada. "É preciso auxiliar a turma a preparar perguntas com base em curiosidades em comum, como: 'beber água salgada faz mal?', 'Se eu cair num rio poluído, preciso ir ao médico?'", exemplifica a consultora. Se não for possível trazer um convidado, prepare uma breve exposição sobre o tema.


Para os atletas, o risco
é a ingestão do líquido,
que pode provocar
mal-estar e doenças. Foto: Tomaz Silva/Agência Brasil

A água como ameaça à saúde


Para aferir o que a garotada aprendeu, a sugestão é encomendar a cada aluno a elaboração de uma ficha relacionando os conhecimentos adquiridos nas pesquisas e na entrevista. 

Distribua folhas de papel sulfite e oriente os alunos a dobrá-las ao meio. De um lado, devem escrever as características que identificaram nas águas da Baía de Guanabara, como sua composição natural e os poluentes encontrados nela. De outro, os cuidados que os atletas devem tomar. 

Tanto as fichas quanto os cartazes podem ser comunicados para toda a escola, a fim de difundir informações sobre cuidados com a saúde e fomentar a discussão ambiental. 

Para encerrar, Sueli Furlan sugere uma roda de conversa para verificar o que as crianças fariam se fossem prefeitos da cidade para tentar resolver o problema. Anotando as falas, você tem um registro tanto das reflexões da turma quanto dos pontos ausentes, que precisarão ser reforçados. "Em  um trabalho como esse, o fundamental é que eles retenham a seguinte ideia: além do problema da falta de saneamento, o próprio desenho da baía dificulta a dispersão de poluentes, uma vez que limita a ação das correntes marítimas. Isso é um exemplo de como fatores naturais e humanos estão ligados na formação da paisagem", acrescenta Jaime Tadeu Oliva, geógrafo pela USP e autor de livros didáticos. 

 

 

 

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