O papo descolado das séries de TV
Vídeos ajudam a moçada de todos os níveis de inglês a entender o uso real da língua
PorBruno MazzocoBruna EscaleiraPedro Silvério
23/08/2015
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Jornalismo
PorBruno MazzocoBruna EscaleiraPedro Silvério
23/08/2015
Quando trocou as aulas no curso de idiomas pelo ensino público, a professora de Inglês Ana Lúcia Sales Rodrigues logo percebeu que teria de se adaptar à nova realidade. Embora os alunos se interessassem pela disciplina, a disparidade no nível de conhecimento do idioma entre eles surpreendeu. Ela, então, decidiu aproveitar a diversidade em prol da aprendizagem, usando séries de TV em atividades com o 8º ano da EMEF Professor Olyntho Voltarelli Filho, em São Caetano do Sul, região metropolitana de São Paulo.
A ideia inicial era trabalhar com a famosa série Friends. "Para minha surpresa, a maioria a achou chata", conta. Para falar sobre o uso de adjetivos e comparativos, a diversidade de características físicas e de personalidade dos personagens de Two and a Half Men parecia um bom gancho para abordar o conteúdo. "Quando cheguei com a caixinha do DVD na mão, eles ficaram super empolgados e curiosos", lembra.
A língua como ela é
"Quanto mais o aluno ouve a língua como ela é, na voz de falantes nativos, mais ele repara em padrões para atribuir significados e sofisticar suas estratégias de compreensão."
LAURA MELONI NASSAR, coordenadora pedagógica do Colégio Oswald de Andrade, em São Paulo.
A principal potência de um material audiovisual é mostrar situações de uso real do idioma. "Quanto mais o aluno ouve a língua como ela é, na voz de falantes nativos, mais ele repara em padrões para atribuir significados e sofisticar suas estratégias de compreensão", afirma Laura Meloni Nassar, coordenadora pedagógica do Colégio Oswald de Andrade, em São Paulo. Além disso, os vídeos estão por toda parte na vida da garotada: na televisão, na internet, no transporte público, nos tablets e nos celulares. Essa familiaridade os aproxima naturalmente do conteúdo.
Mas apenas colocá-los em frente à tela não é suficiente. Para que o trabalho tenha êxito, o bom planejamento das atividades é fundamental. "Usar vídeos em aula não pode servir só para deixá-la mais legal. É preciso saber como explorar o material de acordo com as intenções de aprendizagem", explica Sandra Baumel Durazzo, consultora em línguas estrangeiras da Target Idiomas.
O uso consistente dos recursos audiovisuais pode ajudar a desenvolver as quatro habilidades básicas para o domínio do idioma: escuta, fala, escrita e leitura. A discussão sobre o enredo é uma boa forma de trabalhar a compreensão auditiva e a fala. Já uma produção textual, como uma síntese ou uma resenha crítica sobre o episódio, ajuda a articular a escuta e a escrita. Ao assistir aos vídeos com legendas em inglês, contempla-se a leitura e possibilita-se pensar sobre questões de ortografia e pronúncia. "Existem palavras muito usadas oralmente, mas o aluno não tem contato com sua grafia. Ou palavras que só são conhecidas em sua forma escrita. O uso da legenda promove essa junção que permite pensar a relação entre a escrita e a fala", observa Sandra.
No entanto, é preciso mostrar para os alunos que o que lemos nas legendas nunca é exatamente igual ao que ouvimos. Muitas vezes, a sincronização do texto a um tempo de exibição limitado não corresponde ao ritmo das falas. Além disso, algumas palavras consideradas impróprias ou mesmo gírias e maneirismos são substituídos por expressões similares na legendagem. Por isso, selecionar vídeos bem legendados é importante para o sucesso da atividade. No seriado escolhido por Ana Lúcia, até as gírias usadas pelos personagens eram escritas corretamente (leia no quadro abaixo) . Mesmo assim, Laura recomenda que se assista ao vídeo sem qualquer legenda, pelo menos uma vez, para ampliar a habilidade de escuta.
Além do planejado
Antes de assistir ao episódio, os alunos foram orientados a observar os atributos físicos e a personalidade dos personagens para produzir textos descritivos posteriormente. Para isso, a professora debateu com a turma diferentes formas de construir descrições (leia o exercício no quadro abaixo, à direita) para deixá-las mais interessantes.
Após a exibição, a discussão sobre o enredo trouxe questões relacionadas a passagens específicas que transcenderam o conteúdo de adjetivos e comparativos previsto por Ana Lúcia. "Há uma cena em que a empregada se diverte fazendo um jogo de esconde-esconde com os irmãos Alan e Charlie. Então, a mãe deles pergunta onde estão seus filhos utilizando o Present Perfect: 'Have you seen Charlie?', 'Have you seen Alan?'", conta. A professora aproveitou esse trecho para explicar o contexto e a função comunicativa da frase.
A turma também percebeu que o uso do verbo get varia a cada situação. Ana Lúcia explicou que ele pode assumir diferentes significados de acordo com a preposição que o acompanha: get in, get on, get out, get down, get back. Para Laura, a abertura que a professora demonstrou ao abordar temas não previstos no planejamento ajudou a turma a ampliar o domínio do inglês. "O aluno precisa ter exemplos de como é a estrutura da língua para poder internalizá-la", ressalta Laura.
Expandir repertório não é tarefa fácil. Materiais audiovisuais podem ajudar a inferir o modo de uso de diferentes estruturas do idioma de forma mais natural, sem precisar memorizar regras gramaticais. "Quando mostrei o vídeo com legendas e áudio em inglês, os alunos protestaram um pouco. Mas pude ver sua satisfação ao perceberem que, mesmo sem entender tudo, conseguiram acompanhar a história", lembra Ana Lúcia.
"Esse material atual em inglês foi interessante para aprender um novo vocabulário. O livro didático tem uma linguagem mais formal. Quando você vê as pessoas dialogando na série, fica mais fácil saber como usar as palavras", comenta o aluno Natã Eduardo Lima. Para ele, o trabalho apresentou uma nova situação de aprendizagem. "Gosto das séries The Walking Dead e Breaking Bad. Agora, assisto primeiro em inglês e depois coloco a legenda para ver se entendi direito", conta.
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