As lutas advêm das formas mais rudimentares de defesa, cuja evolução tem acompanhado as transformações históricas da sociedade, constituindo-se uma das manifestações do movimento humano mais expressivas. Tais práticas estão associadas a uma filosofia de vida, na qual o corpo e a mente são compreendidos de maneira indissociável, privilegiando o respeito mútuo e o aperfeiçoamento contínuo. Nesse sentido, é importante que os estudantes conheçam as mais diversas modalidades de lutas presentes no mundo, vivenciando-as de forma significativa, a partir de uma reflexão crítica sobre os elementos que as constituem (LANÇANOVA, 2006; RUFINO; DARIDO, 2015).
Sena (2014) compreende a sistematização de ensino das lutas como uma forma de organizar os conteúdos, buscando contribuir com o processo de ensino-aprendizagem nas aulas de Educação Física, com vista a adequar os conteúdos da disciplina à realidade do contexto escolar, à etapa escolar e às necessidades dos estudantes.
De acordo com a BNCC, as lutas compõem o conjunto de práticas corporais a serem desenvolvidas ao longo das aulas de Educação Física nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental, constituindo-se em “[...] disputas corporais, nas quais os participantes empregam técnicas, táticas e estratégias específicas para imobilizar, desequilibrar, atingir ou excluir o oponente de um determinado espaço, combinando ações de ataque e defesa dirigidas ao corpo do adversário” (BRASIL, 2017, p. 216).
Além das lutas presentes no contexto comunitário e regional, podem ser tratadas lutas brasileiras (capoeira, huka-huka, luta marajoara etc.), bem como lutas de diversos países do mundo (judô, aikido, jiu-jítsu, muay thai, boxe, chinese boxing, esgrima, kendo etc.) (BRASIL, 2017, p. 216).
O universo das “lutas” é permeado por três diferentes terminologias: lutas, artes marciais e esportes de combate. Para alguns estudiosos, os conceitos das diferentes terminologias podem apresentar algumas convergências e divergências, diferentes significados e sentidos.
Para Lorenzo, Silva e Teixeira (2010), as lutas são práticas constituídas por combates corporais, ao passo que as artes marciais estão associadas aos métodos de guerra ou conjuntos de preceitos que um guerreiro deve ter e fazer uso.
Atualmente, muitas “artes marciais” são vistas como “[...] um conjunto de ferramentas socioeducativas que contribuem para o desenvolvimento físico e na estruturação do comportamento e do caráter de seus praticantes, independentemente do local e/ou cultura, respeitando preceitos ético-filosóficos durante sua prática” (MOCARZEL; MURAD, 2012, p. 91).
Os esportes de combate, diferentemente das artes marciais, buscam a superação de um adversário em um determinado contexto competitivo, definido por regras rígidas e cabendo ao vencedor uma premiação. Várias modalidades podem ser ressaltadas como esportes de combate, destacando-se algumas que são mais praticadas e difundidas mundialmente: boxe, luta greco-romana, luta livre, judô, taekwondo, esgrima e Karatê (CAMPOS, 2014).
Considerando as lutas no contexto da Educação Física Escolar, interessa o significado das lutas como práticas de oposição e confrontos, e “[...] parcialmente os aspectos filosóficos e teológicos que envolvem as artes marciais e outras codificações específicas de regras dos esportes de combate” (CAMPOS, 2014, p. 43).
Neste plano, propomos tematizar o sumô, representando as diversas modalidades de lutas do mundo.
Acerca de sua origem, existem referências que datam do século II antes de Cristo (há mais de dois mil anos). O sumô era definido inicialmente por rituais de xintoísmo (tipo de manifestação ou crença religiosa da época no Japão), sendo que as lutas faziam menção a tal fé. Existem duas principais histórias contadas sobre a origem dessa modalidade, a primeira aponta que a luta foi inspirada na luta dos ursos e os movimentos deles durante um confronto. A segunda teoria defende a ideia de que eram lutas entre dois deuses para disputar o controle sobre as ilhas da costa de Izumo, no Japão (PACIEVITCH, 2016).
A prática do sumô é bastante desenvolvida no Japão e os lutadores ou praticantes da modalidade são considerados deuses para a sociedade. Torneios ocorrem desde o século VIII, mas o ringue em seu formato circular, presente nas lutas atuais, surgiu apenas no século XVI. As regras do sumô sofreram inúmeras transformações, sendo que uma das maiores mudanças foi a proibição de ataques que pudessem vir a matar o adversário, como chutar, sufocar, atacar os olhos, golpear com os nós dos dedos ou punhos etc. (FPS, 2016).
O sumô imigrou ao Brasil no início do século XX, e o primeiro campeonato foi registrado em 1914, em Guatapará (SP). A Confederação Brasileira de Sumô foi fundada em 1998 e a Federação Paulista (ainda mais antiga em data de criação) foi fundada em 1962. O Brasil é um dos maiores destaques no sumô amador, ao lado de países, como Rússia, Japão, Ucrânia e Polônia.
O sumô se constitui uma modalidade bastante competitiva, rápida e de contato controlado, em que um lutador (rikishi) tenta arremessar e/ou empurrar o outro rikishi para fora de um ringue circular (chamado de dohy? no Japão) e/ou encostar o chão com qualquer parte de seu corpo, com exceção das solas dos pés. A prática profissional do sumô existe apenas no Japão, os atletas podem receber salários que variam de 31 até 11 mil dólares (IFS, 2016).
Os praticantes dessa modalidade podem utilizar golpes diversos, como o hatakikomi (sair da frente para deixar o adversário cair), tsuridashi (carregar o oponente pela tanga até atirá-lo fora do círculo) e o uwatenage (jogar o adversário por cima do ombro) (PACIEVITCH, 2016).
Bibliografia
BRASIL. Ministério da Educação. Base nacional comum curricular. Brasília: MEC/SEB, 2017. Disponível em: http://basenacionalcomum.mec.gov.br. Acesso em: 25 out. 2020.
CAMPOS, L. A. S. Metodologia do ensino das lutas na Educação Física Escolar. Várzea Paulista, SP: Fontoura, 2014.
CORREA, A.; QUEIROZ, G.; PEREIRA, M. Lutas como conteúdo na Educação Física Escolar. Caderno de Educação Física, Centro Universitário Módulo - São Paulo, 2010.
FPS. Federação Portuguesa de Sumô. Portugal, 2021. Disponível em: http://fedptsumo.weebly.com/regras.html. Acesso em: 5 dez. 2021.
IFS. International Federation Sumo - Federação Internacional de Sumô. Japan,
2021. Disponível em: http://www.ifs-sumo.org/. Acesso em: 5 dez. 2021.
JOKURA, T. Como se luta sumô?. Superdinteressante. Disponível em: https://super.abril.com.br/mundo-estranho/como-se-luta-sumo/. Acesso em: 5 dez. de 2021.
MOCARZEL, R. C. S.; MURAD, M. Sobre o homo diciplinatus: uma visão sócio antropológica do artista marcial. Corpus et Scientia, Rio de Janeiro, v.8, n.2, p.87-98, out. 2012.
PACIEVITCH, T. Sumô. Infoescola, Brasil, 2016. Disponível em: https://www.infoescola.com/artes-marciais/sumo/. Acesso em: 06 dez. 2021.
OLIVIER, J. C. Das brigas aos jogos com regras: enfrentando a indisciplina na escola. Porto Alegre: Artmed, 2000.
PARLEBAS, Pierre. Activités physiques et éducation motrice. Paris: EPS, 1990.
RUFINO, L. G. B.; DARIDO, S. C. O ensino das lutas na escola: possibilidades para a Educação Física. Porto Alegre: Penso, 2015.
Sugerimos a leitura desta dissertação que fala sobre as lutas na Educação Física. Disponível em: https://1library.org/document/rz3llg9z-sistematizacao-conteudo-aulas-educacao-fisica-ensino-fundamental-medio.html. Acesso em: 28 nov. 2021.