Um Quixote em cada versão
Discuta como o trabalho dos tradutores transformou o clássico de Cervantes desde seu surgimento há quatro séculos
PorWellington SoaresPatrick CassimiroMonise Cardoso
04/11/2016
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Jornalismo
PorWellington SoaresPatrick CassimiroMonise Cardoso
04/11/2016
M iguel de Carvantes (1547-1616) morreu há 400 anos. 2016 é o ano para festejar a vida repleta de aventuras do mais célebre autor de língua espanhola. Muitas delas lembram as agruras de seu mais famoso personagem, o engenhoso fidalgo Dom Quixote de La Mancha.
O humor da obra e a habilidade do escritor de colocar na cabeça dos personagens grandes valores da humanidade a tornam essencial. O vocabulário pode assustar sua adoção na escola, mas há caminhos. Uma possibilidade é ler um episódio traduzido e comparar trechos dele em diferentes versões (leia sugestão abaixo).
Proponha que os alunos discutam as diferenças entre cada tradução. O objetivo é reconhecer que a transposição de um idioma para outro não acontece simplesmente encontrando as palavras correspondentes entre as línguas, e que, nas escolhas de cada tradutor, a obra se modifica.
Depois, vale propor a leitura do livro todo, em uma adaptação em português (como a feita pelo escritor Walcyr Carrasco) ou em espanhol (como as distribuídas no Brasil pela editora Santillana Español).
No capítulo 8, após a batalha dos moinhos de vento, o escudeiro Sancho Pança adverte o cavaleiro:
"Yo lo creo todo así como vuestra merced lo dice; pero enderécese un poco; que parece que va de medio lado, y debe de ser del molimiento de la caída."
ORIGINAL (disponível em bit.ly/quixote-original)
"Creio tudo que Vossa Mercê me diz; mas olhe se endireita um poucochinho, que parece ir descaindo para a banda; há de ser do trambolhão que apanhou."
TRADUÇÃO de Eugênio Amado (1983)
"Eu creio em tudo que vossa mercê me diz; mas se aprume um pouco, que parece ir meio de lado, e deve ser por causa da moedura do tombo."
TRADUÇÃO de Sérgio Molina (2010)
No capítulo 25, durante uma discussão entre Quixote e Sancho, o cavaleiro cita Amadis de Gaula, personagem de novelas de cavalaria:
"- ¿Ya no te he dicho - respondió don Quijote - que quiero imitar a Amadís, haciendo aquí del desesperado, del sandio y del furioso, por imitar juntamente al valiente don Roldán, cuando halló en una fuente las señales de que Angélica la Bella había cometido vileza con Medoro, de cuya pesadumbre se volvió loco (...)?"
ORIGINAL (disponível em bit.ly/quixote-original)
"- Já não te disse - respondeu D. Quixote - que quero imitar Amadis, atuando aqui como um desesperado, um demente e um louco furioso, por imitar ao mesmo tempo o valente D. Rolando, quando achou numa fonte uma indicação de que Angélica, a Bela, havia cometido baixeza com Medoro, agravo pelo qual enlouqueceu (...)?"
TRADUÇÃO de Carlos Nougué e José Luis Sánches (2005)
"- Já não te disse - respondeu D. Quixote - que quero imitar Amadis, fazendo aqui de desesperado, de sandeu e de furioso, isto último por imitar juntamente o valente D. Rolando, quando achou numa fonte os sinais de que Angélica a Bela cometera vilania com Medoro, por cuja mágoa enlouqueceu (...)?"
TRADUÇÃO de Sérgio Molina (2010)
Ilustração: Minna Miná
Consultoria: Claudio Bazzoni, assessor da prefeitura de São Paulo e mestre em literatura espanhola, e Maria Augusta da Costa Vieira, professora da Universidade de São Paulo (USP) e maior pesquisadora da obra de Cervantes no Brasil.
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