Organize uma biblioteca... de bolas!
Disponibilizar diferentes opções para as crianças ajuda a aumentar o repertório motor
PorPaula PeresFernanda SallaJacqueline Hamine
14/08/2015
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Jornalismo
PorPaula PeresFernanda SallaJacqueline Hamine
14/08/2015
À primeira vista, quem passa pela quadra da EE Engenheiro Hugo Takahashi, na capital paulista, durante a aula de Educação Física da professora Yara Leticia Silva Abreu pode ficar incomodado com a bagunça: cerca de 30 crianças do 3º ano jogando bolas para todos os lados. Mas a algazarra é apenas aparente. Ela faz parte de uma proposta planejada para ampliar o repertório motor da turma com atividades de arremesso. A convite de NOVA ESCOLA, Fábio Luiz D?Ângelo, coordenador pedagógico do Instituto Esporte e Educação, em São Paulo, foi até lá criar uma biblioteca de bolas (abaixo), com diferentes tipos, para aprofundar o trabalho realizado.
Nos anos iniciais do Ensino Fundamental é importante proporcionar aos alunos a experimentação de situações corporais variadas. "A especialização precoce dos gestos, causada pela separação das aulas por esportes, por exemplo, não proporciona a diversidade necessária para que a criançada aprimore os movimentos", afirma Fábio. Com a criação de um acervo com bolas de tamanhos, pesos e características distintas - como umas que quicam mais e outras menos -, os estudantes ampliam as habilidades motoras, de manipulação e de organização espaço-temporal.
João Batista Freire, professor aposentado da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) explica no livro Educação de Corpo Inteiro - Teoria e Prática da Educação Física (224 págs., Ed. Scipione, tel. 0800-161-700, 48,50 reais) a relação entre as brincadeiras com bolas diversas e o desenvolvimento de repertório corporal. "Se a professora trocar o tipo de bola que estiver sendo utilizado no jogo por outro (...), isso acarretará na criança a necessidade de novos ajustamentos." Ou seja, mesmo que alguém tenha facilidade para manusear a de tênis, por exemplo - que é leve e fácil de lançar com uma mão -, quando recebe uma de basquete, terá de fazer ajustes no movimento para adequar ao material. "Essa ruptura de equilíbrio, criando condições para o estabelecimento de reequilíbrio num nível superior, é uma das funções básicas da Educação", diz João.
Yara oferecia essa diversidade em suas aulas, mas contou com a ajuda de Fábio para organizar o conjunto de bolas da escola, com modelos convencionais de basquete, futebol, tênis e vôlei, além de opções de EVA, borracha e até meia (saiba como confeccioná-la). Ele também sugeriu atividades de lançamento e recebimento (veja algumas delas nas imagens que acompanham esta reportagem), que foram imediatamente incorporadas pela professora.
Para começar a experimentação, a docente incentivou que os alunos conversassem sobre as semelhanças e diferenças entre as bolas. "Cada uma tem um tamanho e um peso", foi uma das colocações feitas. Então, Fábio e Yara pediram que cada um pegasse uma delas, descrevendo características como a menor, a mais pesada etc. A partir daí, deram início a uma sequência de atividades. As primeiras eram individuais, depois o grupo foi organizado em duplas ou trios e, finalmente, chegaram a um jogo coletivo.
Individualmente, os estudantes exploraram cada um seu objeto: bateram no chão para ver quanto pulava, sentiram o peso, lançaram para o alto para perceber a força que deveriam fazer, entre outros movimentos. Os docentes faziam intervenções para que os alunos vivenciassem sensações variadas, como incentivar a troca de bolas entre eles. Na mudança de uma situação para outra, se reuniam para falar sobre a experiência, como a dificuldade com bolas maiores.
Em seguida, Yara pediu que jogassem a bola para o alto e batessem palma antes de recebê-la de volta, com um desafio: "Quantas vezes vocês conseguem fazer isso até pegar a bola novamente?". Nesse momento, ela chamou a atenção da turma para os movimentos e as descobertas dos próprios alunos para que todos avançassem.
Kelwynn Santana Ventura, 8 anos, observou que, quanto mais alto jogava a bola, mais palmas conseguia bater. Leonardo Colombo Conceição, 8 anos, mantinha uma das mãos nas costas ao lançar a bola para cima, e a recebia com a outra. Ele trocava as mãos a cada novo arremesso. Fábio provocou: "Olhem o que ele faz! Quem mais consegue?". E assim todos tentaram a atividade, que misturava duas tarefas de coordenação motora.
Em duplas, a criançada fez exercícios de arremesso e recebimento da bola. Primeiro, eles a jogavam de um para outro. Depois, a lançavam por cima de um elástico estendido no alto, de uma ponta a outra da quadra, até que ela chegasse ao colega. Aos poucos, os docentes foram aumentando o número de participantes e de bolas. "Eu precisava prestar atenção em arremessá-la e já receber outra em seguida", resumiu Leandro dos Santos Ferreira, 9 anos. Com isso, o desafio era maior e os docentes tiveram condições de observar melhor os movimentos dos estudantes.
Por fim, Yara propôs um jogo coletivo em que uma bola de basquete murcha (chamada bomba) foi posta no centro da quadra. Divididas em dois times, as crianças tinham de jogar uma bola em direção à murcha. O intuito era levá-la ao campo adversário. O gesto feito e a força aplicada no arremesso variavam de acordo com o tamanho e peso do brinquedo. Para avaliar os alunos, foram observados os avanços deles em seus movimentos. A "biblioteca" ficou disponível para ser revisitada nas aulas e no recreio, permitindo que a garotada se especialize cada vez mais.
Sozinhas, as crianças exploraram as características das bolas misturando movimentos de lançamento e recebimento com outros gestos (troca de mãos e palma). Assim, trabalharam a coordenação motora.
Ao jogar a bola para um colega por cima do elástico, os alunos administraram a força aplicada e o manuseio de acordo com cada tipo. As de EVA, por exemplo, costumam desviar o curso por serem leves e grandes.
Todos tinham de acertar com uma bola a que estava murcha no centro (bomba) até que ela chegasse ao campo adversário. A forma como cada criança faz o arremesso para acertar a bola murcha (se rola no chão ou joga por cima) pode ser compartilhada numa roda de conversa para ampliar o repertório de estratégias de todos.
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