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Jornalismo

Em croquis, a turma inventa paisagens

Criar lugares permite relacionar conceitos importantes, como clima, relevo e hidrografia

PorCamila Camilo

14/01/2016

Clima O aluno elegeu o outono como característica de seu lugar. A escolha afetou as demais.
Vegetação Árvores de poucas folhas constituem a paisagem do local afetado por essa estação.
Hidrografia As margens dos rios são férteis e agricultáveis. Esse tema foi muito debatido em sala.
Toponímia Montes, rios, templos e outros lugares foram identificados com nomes próprios. 

Integrar os diversos conteúdos geográficos estudados pela criançada é um desafio para qualquer professor. Preocupado com isso, Pedro Maciel da Costa Ferreira, da Escola Viva, em São Paulo, propôs aos estudantes do 6º ano a produção de um catálogo com desenhos e descrições de lugares inventados por eles próprios. Dessa maneira, os conceitos de hidrografia, clima, paisagem, formação e dinâmica do relevo, já estudados ao longo do ano letivo, foram revistos. "É comum ensinar esses elementos separadamente, mas eles estão interligados", explica. 

A Geografia compreende desde a dinâmica do globo terrestre até a organização política e social. Sua abrangência e o tempo curto dentro da grade curricular podem dificultar a apresentação conjunta dos temas. Por isso, propor um trabalho de síntese como esse é uma boa estratégia. 

A referência para o projeto foi o Dicionário de Lugares Imaginários (Alberto Manguel e Gianni Guadalupi, 512 págs., Ed. Companhia das Letras, tel. 11/3707-3501, edição esgotada). O livro detalha, com ilustrações e textos, terras que só existem na literatura. Quem não tem a obra à disposição pode usar outras que trazem descrições parecidas. A geógrafa Sônia Maria Vanzella Castellar, da Universidade de São Paulo (USP), sugere As Cidades Invisíveis (Italo Calvino, 152 págs., Ed. Cia. das Letras, 36 reais) e o livro infantil Viagens para Lugares Que Eu Nunca Fui (Arthur Nestrovski, 72 págs., Ed. Cia. das Letrinhas, tel. 11/3707-3501, 39,50 reais). Outra ótima opção é buscar representações geográficas em histórias mais conhecidas, como as do escritor Monteiro Lobato (1882-1942). 

Para começar o trabalho, Ferreira levou um roteiro que continha a apresentação do projeto, a composição da nota, o cronograma e os objetivos. "Isso permite ao aluno saber o que se espera dele. Também é um instrumento de acompanhamento para a família", diz. O documento tinha um passo a passo, mas não era estanque.

Depois de ler o programa, a meninada tirou dúvidas sobre o que seria feito nas aulas seguintes. A partir daí, a orientação era consultar o caderno e revisar o que havia sido estudado. Os assuntos já vistos serviram de apoio para cada aluno criar sua localidade. Como referência, todos leram o verbete do cenário de O Mundo Perdido, de Arthur Conan Doyle (1859-1930), descrito no Dicionário de Lugares Imaginários, e analisaram produções de anos anteriores. 

Ao longo do projeto, os estudantes produziam em casa textos sobre os itens obrigatórios dos espaços idealizados por eles: descrição da paisagem, nome, histórico - feito em parceria com o professor de História -, características do clima e organização política e social. Também era possível acrescentar curiosidades como hino, bandeira, alfabeto ou pratos típicos. 

Em classe, trios ou duplas formados pelo docente debatiam os textos produzidos como lição e sugeriam melhorias. Em seguida, eles incorporavam as sugestões aos textos individuais. A garotada voltava para casa com a tarefa de redigir um novo item, que seria discutido no encontro seguinte e melhorado com o auxílio do grupo. Essa dinâmica se repetiu até a quinta aula, quando o texto chegou a uma versão mais completa e os jovens começaram a desenhar. No roteiro de estudos, havia uma definição breve do que é um croqui. Além disso, o grupo já conhecia esse tipo de desenho de aulas anteriores de outras disciplinas. "É uma forma de representar o espaço típica da Geografia, apesar de não envolver os procedimentos técnicos e as regras da cartografia formal. Prepara a meninada para representações mais complexas", explica Ferreira. Se seus alunos não conhecem essa forma de registro, é possível encontrar exemplos em livros didáticos. Em todos os momentos, a turma recorria ao caderno e era abordada pelo educador, que fazia intervenções como averiguar a coerência entre os elementos.

Criatividade a todo vapor

Hidrografia Tema de aulas anteriores, foi explorada nesse lugar, onde a foz do rio é o mar.
Relevo O curso natural da água afeta o relevo. Também houve preocupação em nomear os locais.
 


Os estudantes soltaram a imaginação e fizeram cidades variadas. E a criatividade atuou a favor do objetivo de relacionar os conteúdos. "Os jovens dessa faixa etária precisam fazer isso usando a memória e a inventividade", diz Adolfo Neto, da Universidade Federal do Pará (UFPA). Para a Vila do Sempre Outono, por exemplo, o professor indicou que o aluno se preocupasse com a influência do clima. As condições climáticas determinaram outras características, como a vegetação e a exploração de folhas como alimento. A localização dos elementos e a existência de várzeas férteis, tema das aulas, foram usadas pelo jovem. "O fundamental é entender a organização dos espaços e como um componente interage com o outro", diz Regina Araújo, coautora das orientações curriculares do Estado de São Paulo. 

Entre os alunos, havia dois com necessidades educacionais especiais (NEE). Em reuniões prévias com a auxiliar, as potencialidades de cada um deles foram identificadas, assim como o que era necessário para a adaptação. O estudante com dificuldades motoras usou o computador, que facilitava seus movimentos. Já a menina com síndrome de Down fez o mesmo trabalho que os demais, só que com um número menor de itens: nome da localidade criada, paisagem e o croqui. Segundo Maria Cláudia Dantas, psicopedagoga clínica e escolar, definir os objetivos com base nas possibilidades de cada criança é essencial. 

Durante a produção dos croquis, vale observar como são particulares os critérios utilizados pelos estudantes. Eles podem não usar métricas ou escalas convencionais, mas isso não significa ausência de critério. "Nessa faixa etária, é comum aproximar elementos por afinidade ou traçar com um tamanho maior o que parece mais importante", diz Fernanda Padovesi Fonseca, da Universidade de São Paulo (USP). Ao concluir um projeto desse tipo, os alunos aprendem a interpretar a paisagem e começam a reproduzi-la. Também têm uma visão integrada dos conceitos trabalhados ao longo do ano letivo.

1 Produção de texto Depois de indicar referências de leitura, sugira a produção de textos sobre lugares imaginários. Os estudantes devem criar um nome para eles, bem como descrever elementos como paisagem, clima, hidrografia e relevo. 

2 Elaboração dos croquis Em classe, proponha a formação de grupos para revisar coletivamente os textos. Faça intervenções pontuais, questionando as escolhas feitas pelos estudantes. Peça que cada aluno desenhe seu croqui com base nos dados dos textos.

 

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