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Jornalismo

Coordenação pedagógica: provas testadas e aprovadas

Projeto de formação analisou os registros dos alunos para repensar as avaliações

PorElisângela Fernandes

31/05/2016

Janaina e os professores combateram o baixo desempenho da turma. Foto: Marina Piedade

Há tempos as avaliações na escola deixaram de ser vistas como punição para se tornarem aliadas do ensino. Ao analisar os resultados, é possível verificar se os alunos aprenderam o que foi planejado e obter informações relevantes para aperfeiçoar a prática docente. Janaina Oliveira Barros, coordenadora pedagógica da EM Professora Ivani Oliveira, em Seabra, a 456 quilômetros de Salvador, soube aproveitar bem esse potencial. No início do ano, após planejar e realizar junto com os docentes uma avaliação diagnóstica para cada disciplina dos anos finais do Ensino Fundamental, ela analisou detalhadamente os resultados e constatou que o aproveitamento dos estudantes estava baixo. Em média, eles acertaram apenas cerca de 40% das questões em todas as áreas. Para melhorar esse quadro, ela apresentou aos professores um plano de formação continuada com foco nas avaliações. 

"Para muitas pessoas, voltar e analisar a produção dos estudantes pode parecer só uma estratégia, mas para mim é uma concepção de trabalho. Nunca vou saber o que de fato eles aprenderam se não estiver de olho no que estão escrevendo no caderno", diz a gestora. Ela lembra que foi nos diversos encontros que participou como aluna e formadora do Instituto Chapada de Educação e Pesquisa (Icep), em Palmeiras, a 440 quilômetros de Salvador, que entendeu a importância de considerar os registros dos alunos.

Ao longo de um semestre, durante as reuniões de formação e de conselhos de classe das turmas da 5ª à 8ª série, o grupo analisou as provas que haviam sido elaboradas. Nos primeiros encontros, os educadores levantaram hipóteses sobre o porquê do baixo desempenho dos alunos. A coordenadora ouviu deles que a indisciplina era o principal motivo, seguida da falta de registros adequados nos cadernos e do desinteresse geral pelos estudos. "Quando reuni todas as hipóteses, eles se assustaram, pois as falas indicavam que os adolescentes eram 100% responsáveis pela não aprendizagem", lembra. 

Janaina selecionou, então, avaliações feitas por um professor e o caderno de um dos melhores alunos dele para uma análise coletiva. Depois, o estudo de caso foi estendido aos demais. A coordenadora pediu que cada um socializasse com o grupo uma de suas provas e os registros de um jovem. Todos tinham de comparar os dois materiais e propor recomendações para melhorar a elaboração da avaliação, aproximando-a do conteúdo registrado nos cadernos. Assim, ao longo do semestre, todos tiveram a oportunidade de avaliar materiais de colegas e de ouvir os comentários deles. O papel da gestora foi problematizar as sugestões que já faziam parte da rotina de todos e as que teriam de ser incorporadas. Durante o processo, o apoio do diretor Lauro Roberto Ferreira foi fundamental para instituir uma rotina de planejamento e de formação continuada com a equipe, com horários fixos de estudo.

Exames na medida certa

Cada professor escolheu uma prova e um caderno para fazer um estudo de caso. Foto: Marina Piedade

Adequação aos cadernos A probabilidade de se deparar com baixos resultados na prova é menor quando se avalia o que os alunos efetivamente registraram nos cadernos e nas atividades de lição de casa. A análise desse material permite verificar quais são as dúvidas mais comuns na turma, o que de fato foi aprendido e o que ainda é preciso ensinar ou esclarecer melhor. Isso evita a cobrança de conteúdos que foram trabalhados muito superficialmente ou apenas citados em uma aula expositiva, por exemplo. 

Coerência com o planejamento Pense na avaliação desde o início do bimestre ou trimestre. Ao elaborar o plano de ensino, você precisa ter clareza sobre quais são os objetivos de aprendizagem que serão cobrados nas provas a ser realizadas no fim de cada etapa. Retomar o planejamento ao longo do semestre também colabora para saber se as metas propostas no começo do ano letivo estão sendo alcançadas de fato.

Questões claras e objetivas Nem sempre uma resposta em branco indica que o estudante não domina o conteúdo. E, se muitos erraram a mesma questão, é melhor desconfiar. Nos dois casos, o problema pode estar na pergunta apresentada. Para evitar isso, é fundamental garantir enunciados claros. Ao escrever uma questão, compartilhe com outros docentes para verificar se eles compreendem o que você solicitou. Evite questões longas ou que abordem vários pontos ao mesmo tempo. E lembre-se de que a linguagem e o vocabulário usados devem estar adequados ao nível de leitura da classe. 

Familiaridade com o tipo de prova Se a turma não está habituada a questões dissertativas, você não pode cobrar respostas desse tipo. O mesmo vale para as de múltipla escolha ou, ainda, a interpretação de gráficos. Uma atividade que nunca esteve presente nas aulas e nos cadernos dos estudantes não deve aparecer de surpresa na prova. O bom exame é aquele em que o aluno não leva susto nem encontra pegadinhas. Ele deve reconhecer ali os conteúdos e conceitos trabalhados em sala. Cabe a você elaborar desafios que permitam aos adolescentes mobilizar tudo o que aprenderam sobre o assunto sem medo. 

Nível de dificuldade ajustado Se no dia a dia você leva para a turma situações-problema de média ou baixa complexidade, não dá para cobrar na prova temas muito difíceis. Caso faça isso, os riscos de fracasso na avaliação serão grandes. Contudo, isso não significa que é vetado incluir uma ou outra questão mais desafiadora. Ela só não pode ter o mesmo peso das demais e precisa apresentar relação com algum conteúdo que foi estudado pela turma.

É dia de prova e está tudo bem 

A equipe passou a analisar as avaliações e os resultados antes de levar à turma. Foto: Marina Piedade

Após intensas reflexões, muitos educadores se deram conta de que as provas que realizavam não dialogavam com o que haviam trabalhado em sala e de que o nível de dificuldade não era adequado. "Os alunos tinham de ler textos em inglês na avaliação, mas eu não havia trabalhado isso em classe", admite a professora Débora Cristina Oliveira Braga. Segundo ela, depois dessa discussão suas provas foram aperfeiçoadas e o desempenho dos alunos melhorou. A turma passou a se sentir mais segura nos dias dos exames porque sabia que eles contemplariam de fato o que ela tinha abordado em aula. 

Janaina conseguiu unir o grupo e fazer com que todos se sentissem responsáveis pela aprendizagem dos adolescentes. Ao apresentar os problemas a superar, como a falta de coerência entre o conteúdo trabalhado nas aulas e o cobrado nas avaliações, a coordenadora teve o cuidado de não apontar as provas mais bem elaboradas ou as que precisavam de mais melhorias. "O meu objetivo foi mostrar o que todos tinham em comum e em que aspectos precisavam avançar", lembra. 

A estratégia usada em Seabra está alinhada às ideias de Cipriano Carlos Luckesi, autor de Avaliação da Aprendizagem - Componente do Ato Pedagógico (Ed. Cortez, 448 págs., tel. 11/3611-9616, 65 reais). "O foco do avaliador está centrado na busca do melhor resultado do ensino e da aprendizagem. Caso o resultado não seja positivo, ele não condena o educando nem o educador, mas investiga onde está o impasse, que variáveis estão interferindo desfavoravelmente", escreve. 

Para Paula Zurawski, selecionadora do Prêmio Victor Civita Educador Nota 10 e professora do Instituto Superior de Educação Vera Cruz (ISE Vera Cruz), o grande mérito do projeto é que a coordenadora proporcionou boas situações para os docentes refletirem sobre o que realmente ensinaram e o que esperavam dos estudantes nas avaliações e, dessa maneira, perceberam possíveis incongruências entre uma situação e outra. 

Com tudo isso, a prática do grupo mudou para melhor. No quadro da página anterior, você confere alguns dos aprendizados que Janaina e os professores incorporaram na EM Professora Ivani Oliveira e que você também pode incluir no seu dia a dia.

"As intervenções de Janaina me ajudaram a tornar os enunciados das provas mais claros."

Ana Maria Souza Santos, professora de Língua Portuguesa de 6ª e 7ª séries

"Não fico mais perdida, pensando no que vou avaliar. É só rever os planos de aulas e as atividades realizadas." 

Mary Daiana Santos Vieira, professora de História de 5ª a 8ª série

 

1 Análise do passado Recolha para análise exemplos de avaliações realizadas no último bimestre. Discrimine o porcentual de acertos em cada questão e compile os resultados. 

2 De olho nos registros Selecione alguns cadernos de alunos que tiveram desempenhos diferentes nas provas. Analise o que foi registrado por eles nas aulas e nas tarefas de casa. Verifique se há relação entre esse material, o plano de ensino e as avaliações. 

3 Avaliação aprimorada Ao planejar a próxima prova, confira se os enunciados estão claros, se o nível de dificuldade está adequado e se o conteúdo das questões foi trabalho em sala. Após a correção, compare os acertos com os exames anteriores.

 

Em vídeo, Janaina fala sobre a importância do diagnóstico:

 

 

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