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Jornalismo

O Brasil não pode mais perder bons professores

Mudanças estruturais são fundamentais para manter os docentes na rede pública e atrair os jovens para o Magistério

PorNOVA ESCOLAPaula PeresElisa Meirelles

12/07/2016

Mudanças estruturais são fundamentais para manter os docentes na rede pública e atrair os jovens para o magistério. Ilustração: Benett

Nos últimos meses, dois temas tomaram as manchetes dos jornais. De um lado, surgiram registros cada vez mais frequentes de exoneração de professores na rede pública em diversos estados e municípios. De outro, o número de jovens interessados em ingressar em carreiras ligadas à Educação não acompanhou o aumento em outras áreas de nível superior. Em comum, essas reportagens têm o problema que retratam: a desvalorização do Magistério. 

O assunto não é novo, mas vale retomá-lo e colocar luz sobre aspectos que precisam ser discutidos e modificados. O estudo Teacher Status Index, realizado este ano pela Fundação Varkey Gems em 21 países, ajuda a entender onde está o problema. Os pesquisadores avaliaram o status do professor e encontraram respostas contraditórias no Brasil. Enquanto o país é o que mais confia nele como profissional capacitado a dar uma boa Educação aos alunos, menos de 20% dos entrevistados encorajariam os filhos a seguir a carreira docente. Na China, o índice é de 50%. 

As respostas mostram que o discurso da valorização da Educação, infelizmente, está dissociado da profissão de professor. Fala-se muito na importância do docente, sem que se discuta, em igual proporção, aspectos ligados a formação, carreira e condições de trabalho. Sem esse olhar atento, a escola vai pouco a pouco perdendo suas equipes. 

A pesquisa Desistência e Resistência no Trabalho Docente, de Andréa do Rocio Caldas, da Universidade Federal do Paraná (UFPR), com professores da rede municipal de Curitiba, mostra que os fatores para o abandono da profissão são velhos conhecidos de todos: baixos salários, problemas físicos e psicológicos, infraestrutura escolar precária, violência no ambiente de trabalho, pressão e cobrança por resultados, sentimento de desvalorização da profissão pela sociedade e falta de apoio das famílias dos alunos.

Essas questões se refletem em números. De acordo com a Secretaria de Estado de Educação de Minas Gerais, até agosto deste ano houve 1.283 pedidos de exoneração na rede pública - uma média de cinco por dia. Como parte dos professores acumula funções, não há como afirmar precisamente quantos docentes deixaram as salas de aula, mas trata-se de um porcentual considerável. Casos semelhantes se repetem em outros estados e municípios. No Rio de Janeiro, segundo o Sindicato Estadual dos Profissionais de Educação, 542 professores haviam pedido exoneração até setembro. A quantidade difere da conta apresentada pela Secretaria de Estado de Educação, que fala em uma média de 350 ao ano. Número semelhante é apontado pela Secretaria de Estado do Paraná. Em Mato Grosso, em 2012, foram 107. 

Os dados apontam para outro fator crucial: a formação docente. Estudo das fundações Victor Civita (FVC) e Carlos Chagas (FCC) mostram que muitas faculdades de Pedagogia não dão ao universitário o embasamento teórico para lidar com as diferentes etapas da aprendizagem. Já os cursos de Licenciatura estão preocupados em trabalhar o conteúdo das disciplinas e esquecem as didáticas. 

Faz-se necessário, portanto, rever os currículos. Cabe à universidade formar professores que dominem os conhecimentos sobre o objeto de ensino, a forma com que o aluno se aproxima dele e as condições didáticas e intervenções necessárias ao seu avanço. A regra vale, também, para a formação continuada. Rede e coordenação pedagógica têm de ser vistas como parceiras do docente no ofício de ensinar, não como atores que cobram resultados, sem ajudar a alcançá-los.

Reflexos no ingresso na carreira 

Os mesmos problemas que levam muitos educadores a mudar de área ajudam também a explicar o baixo interesse dos jovens pela profissão. Segundo o Censo da Educação Superior, o número de brasileiros que cursa o Ensino Superior vem crescendo, mas a quantidade de pessoas que ingressa em áreas ligadas à docência não aumenta na mesma proporção. De 2011 a 2012, as matrículas em cursos de graduação em geral cresceram 4,4% mas nos de Licenciatura o porcentual foi de 0,8%. Ao analisar quem conclui o nível superior, os números preocupam ainda mais. No mesmo período, o total de pessoas que terminou a Licenciatura caiu 6% no país, enquanto as outras áreas apresentaram crescimento (leia o gráfico abaixo). 

Ao questionar estudantes que estavam terminando o Ensino Médio sobre o futuro, a FVC e a FCC constataram que apenas 2% indicavam graduações diretamente ligadas à escola como primeira opção no vestibular. Os jovens reconheciam a importância do professor, mas afirmavam que a profissão é desvalorizada pela sociedade e possui uma rotina desgastante e desmotivadora. Muitos haviam chegado a essas conclusões ao observar as dificuldades que seus próprios docentes enfrentavam no dia a dia. 

Além da resistência inicial, há ainda quem ingresse na Pedagogia ou faça Licenciatura sem ter a carreira de professor como foco. O estudo Atratividade do Magistério para a Educação Básica, realizado pela pesquisadora Luciana França Leme com estudantes da Universidade de São Paulo (USP), mostra que 52% dos alunos de Licenciatura em Física e 48% dos de Matemática não querem lecionar ou têm dúvidas quanto a seguir a carreira. Na Pedagogia, o índice fica em 30%. Entre os fatores que os levam a questionar a profissão está o receio de não entrar em uma escola conceituada, em que tenham autonomia para criar projetos e fazer um trabalho pelo qual sejam reconhecidos. 

Voltamos, portanto, ao argumento inicial. Sem perspectivas convidativas de formação, carreira e condições de trabalho, é muito difícil reverter esse quadro. Um avanço importante está expresso no Plano Nacional de Educação (PNE), em votação no Senado Federal. O texto coloca, nas metas 15 e 16, a importância da formação inicial e continuada. Na meta 17, defende-se a equiparação salarial dos professores com outras carreiras de nível superior e, na 20, a necessidade de ampliar os investimentos na área para garantir que essas ações sejam colocadas em prática. Acompanhar e cobrar a aprovação de cada uma dessas metas é, portanto, fundamental.

Ensino Superior

Número de concluintes da licenciatura não cresce na mesma proporção que os das demais áreas


Fonte Censo da Educação Superior


 

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