“Não conhecemos as boas e as más práticas de uso de verbas”
Registrar, avaliar e compartilhar as experiências é essencial para ter políticas eficientes
PorKarina PadialRosi RicoPatrick Cassimiro
10/11/2015
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Jornalismo
PorKarina PadialRosi RicoPatrick Cassimiro
10/11/2015
Ricardo Madeira,
Professor de Economia da Universidade de São Paulo (USP) e pesquisador da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe)
Professor de Economia da Universidade de São Paulo (USP) e pesquisador da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe), Ricardo Madeira se dedicou, nos últimos anos, a avaliar o sucesso de políticas sociais. Para ele, o debate sobre experiências internacionais que dão maior poder de decisão às redes e às escolas deve considerar que isso pode criar desigualdades. GESTÃO ESCOLAR quis entender melhor essa ressalva e saber o que precisa ser feito para obter um retorno mais eficiente dos investimentos na área.
RICARDO MADEIRA Em um país continental, com tantas diferenças como o nosso, ter uma Educação em nível federal não é desejável. Até os estados muito grandes têm dificuldade de gestão. A municipalização aconteceu muito em razão disso: era preciso dividir a administração e o financiamento. No caso de uma provisão direta, ou seja, quando o poder público arca com todos os custos do setor oferecendo Educação gratuita, como ocorre no Brasil, é interessante que ela seja feita pelos governos locais. As prefeituras estão mais próximas da comunidade e, portanto, entendem melhor as demandas e respondem de maneira mais ágil a elas. E essa é uma vantagem. O problema são as elites locais, que podem querer se apropriar do bem público. Esse processo precisaria vir acompanhado da capacitação das autoridades regionais. No meu doutorado, avaliei o programa Professor de municipalização de São Paulo e verifiquei que ele funcionou bem para as cidades que já tinham um bom nível de ensino. Essas melhoraram em desempenho. Mas aquelas com indicadores ruins pioraram. Outros estudos mostram o mesmo. Isso nos leva à conclusão de que regiões mais pobres, que carecem de recursos humanos, são prejudicadas, aumentando ainda mais a diferença em relação às redes mais ricas e estruturadas.
Ele contribui para a autonomia das escolas de uma maneira positiva. Muitas vezes, o que vemos é uma descentralização da responsabilidade, mas não do orçamento. E daí a gestão fica engessada porque tem mais questões para resolver, mas não consegue arcar com as despesas que elas geram. É claro que há outros pontos a debater. Mas esse é o modelo que temos. O repasse deveria prever um sistema transparente e universal de prestação de contas. No entanto, tudo o que sabemos hoje é quanto cada município gasta por nível de ensino, dividido entre folha de pagamento dos professores e o resto. Não temos outras informações sobre cada instituição, como o que ela recebe do governo federal, do estado ou do município.
Há um entendimento de que é necessário um incremento nos investimentos destinados à Educação, mas antes precisamos entender como eles são utilizados. Há pesquisas brasileiras que encontraram uma relação muito fraca entre o aumento de recurso e a melhoria da qualidade do ensino oferecido. Então, provavelmente, não estamos sendo muito eficientes. Isso não quer dizer que haja corrupção ou desvio, mas, simplesmente, que não conhecemos as boas e as más práticas de uso das verbas. É complexo investir em Educação porque é possível direcionar as verbas para várias áreas remuneração dos docentes, formação inicial, infraestrutura das escolas etc. Precisamos saber em qual delas alcançaríamos o maior retorno, mas não temos essa resposta.
Documentar, avaliar e socializar as iniciativas. Uma das grandes vantagens da autonomia é a experimentação. Os municípios concentram basicamente toda a primeira etapa do Ensino Fundamental e a Educação Infantil. São mais de 5 mil cidades. Como cada uma tem liberdade para implantar suas políticas, o que possuímos é um grande laboratório de práticas educacionais. O ideal seria buscar entender o que funciona ou não e depois divulgar os resultados para que a sociedade se beneficie do que deu certo.
Na Educação, precisamos de equipes que avaliem as estratégias e dividam esse conhecimento com instituições que têm o mesmo contexto.
Da federação, mesmo que a gestão da rede esteja a cargo dos governos locais. Isso ocorre com avaliações padronizadas, ponto em que temos sido bem-sucedidos. Mas também poderia ser por meio de uma estrutura que sistematize as experiências, permita que elas sejam compartilhadas e ofereça recursos para a análise de resultados. Por exemplo, o pequeno agricultor brasileiro que está com dificuldades, sabe que o governo tem especialistas que podem ajudá-lo. Eles vão até o campo e falam: "Olha, para esse tipo de solo e de cultivo, recomendamos tais técnicas, sementes, períodos para colheita etc.". É o que a Educação precisa: de equipes que avaliem as estratégias e dividam esse conhecimento com instituições que têm o mesmo contexto.
Quando falo que elas são bem-sucedidas é porque conseguimos avançar na elaboração de provas padronizadas e na apresentação de resultados à sociedade. Mas compartilho dessa crítica. Os exames não têm caráter formativo. Estão servindo apenas para prestar contas por meio de rankings. A informação nunca volta de maneira a possibilitar que o professor entenda quais são os desafios dos seus alunos e como pode atuar para que eles avancem. Só agora é que está se começando a pensar em como dar uma devolutiva pedagógica.
Foto: Silvia Zamboni
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