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Jornalismo

A brincadeira virou dança. Ou o contrário?

Reportagem da edição 259, de janeiro/fevereiro de 2013, indicada por Marisa Szpigel

PorNOVA ESCOLAMonise Cardoso

15/01/2016

"Fazer Arte na Educação Infantil é extremamente complexo pelo desafio que é entrelaçar de modo significativo as diversas áreas do conhecimento. A professora retratada na reportagem me ajudou a compreender que o trabalho com o corpo é um eixo indispensável nesse sentido, pois se conecta naturalmente com o que há de mais espontâneo no processo da criança pequena de conhecer o mundo: o brincar."

Marisa Szpigel, professora e coordenadora de Arte do Ensino Fundamental 2 da Escola da Vila, em São Paulo, e  formadora de professores da Educação Infantil e do Fundamental.

 

A brincadeira virou dança. Ou o contrário?

Experimentando movimentos, descobrindo as pedras do quintal e ouvindo o som da água, a garotada explorou o corpo e ambiente

Texto Beatriz Santomauro

 

Essas crianças de 5 e 6 anos foram alunas da professora Cris Mara na Creche Central da Universidade de São Paulo (USP), na capital paulista. Uma vez por semana elas se encontravam na disciplina de Dança Criativa

Nadar sobre um rio caudaloso formado por tecidos, caminhar equilibrando pedrinhas no alto da cabeça, ouvir o som da água que cai numa bacia, pular amarelinha em um pé só, entrevistar adultos e conhecer uma obra de arte. Variadas, divertidas e desafiadoras, todas essas situações foram propostas a turmas de 5 e 6 anos por Cristina Mara da Silva Corrêa, que leciona Dança Criativa na Creche Pré-Escola Central da Universidade de São Paulo (USP), na capital paulista. 

DANÇA E MÚSICA Para simular um banho de cachoeira, não faltou criatividade. Os pequenos nadaram em um rio de tecido e refizeram os sons da natureza

Cris Mara, como é conhecida, quis relacionar a dureza das pedras e a fluidez da água com o movimento do corpo, formando uma dança. Uma combinação difícil de enxergar? Sem dúvida. Mas muito bem elaborada e fundamentada. Bailarina e pesquisadora do ensino da dança, a educadora baseia seu trabalho nas teorias de Rudolf Laban (1879-1958), educador austro-húngaro, que defendia as experimentações pelo praticante da dança e a importância do processo (e não só do resultado) no aprendizado dessa arte. Para ele, era essencial o professor explorar a trajetória espacial, as ações corporais (arrastar, rolar, lançar etc.) e o tempo em que isso é feito (lento ou rápido) sem perder a espontaneidade do gesto da criança. Laban destacava a importância de os pequenos passarem por experiências diversas e estudarem o corpo antes de partirem para o improviso e construírem um percurso de criação. 

MOVIMENTO NO QUINTAL Em brincadeiras de roda como esta, as crianças ampliaram sua diversidade de gestos. Na Educação Infantil, cantar e se divertir deve ser rotina

As primeiras atividades ocorreram no quintal da escola, quando a professora propôs que as crianças procurassem pedras e gravetos e, sentadas em roda, fizessem uma escultura. Em seguida, disse que se lembrassem de brincadeiras que usam pedrinhas. A primeira delas foi a amarelinha, que praticaram em diversos formatos desenhados no chão. A turma citou ainda a cinco marias, em que elas são jogadas para o alto e recuperadas de vários jeitos.

Para que os pequenos conhecessem diferentes modos como a pedra e também a água aparecem na sociedade, Cris Mara explorou três situações. Na primeira, levou a turma a uma exposição com obras feitas com os dois recursos. Em outra ocasião, mostrou livros e fotos de trabalhos de artistas com esse mesmo enfoque. Por fim, propôs que entrevistassem funcionários da escola e perguntassem quais brincadeiras com pedra e água estiveram presentes na infância deles, registrando o momento com uma filmadora. "A turma ampliou o repertório sobre os usos desses elementos em épocas e contextos diversos e incorporou o que viu a sua maneira de brincar", diz Clélia Cortez, coordenadora do Programa Formar em Rede do Instituto Avisa Lá. 

PASSOS DA CRIAÇÃO Entrevistar funcionários, fazer esculturas e apreciar obras de arte foram propostas para as crianças pensarem sobre a água e as pedras

Para vivenciar, mesmo que só na imaginação, um ambiente com pedras e água, as crianças simularam um banho de rio no meio da floresta. Algumas tocaram instrumentos de percussão e sopro e jogaram a água em uma bacia, imitando o som de uma cachoeira. Outras andaram sobre pedrinhas e se arrastaram sobre tecidos, como se estivessem nadando. A fantasia era alimentada pela educadora, que dizia: "A água está muito forte. Precisa fazer força para nadar!", "Que barulho está nesta floresta!" e ainda "Como é difícil caminhar!". No encontro seguinte, elas equilibraram pedrinhas no corpo enquanto ouviam o som de um tambor ou de músicas tranquilas. Ao variar as propostas, Cris Mara permitiu que os pequenos modificassem ainda mais as maneiras de se movimentar tendo um propósito para isso. 

Depois disso, a turma foi dividida em grupos e cada um criou uma sequência de movimentos com base nas experiências vividas - rastejar, pular, mover os braços etc. A coreografia final foi uma junção de todas elas. "Percebi que as crianças ficaram muito envolvidas com as atividades. Quanto mais conheciam e se apropriavam das novas brincadeiras, maiores eram suas referências e as formas de experimentar com o corpo", diz Cris Mara.

CURTI

"Aprendi muitas brincadeiras! O seu Sizino (funcionário da escola) contou que jogava pedrinhas no rio de um jeito que elas pulavam antes de afundar."

ROSA MANSOR VICHI, 6 ANOS

Veja galeria de fotos do projeto de Cristina Mara

Foto entrevistada: Rogerio Pallatta

Fotos reportagem e galeria: Marina Piedade

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