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Jornalismo

Para formar leitores críticos e bons autores

Pesquisa, leitura e discussão ajudam estudantes de Porto Alegre e São Paulo a entender informações verbais e visuais e produzir textos em diferentes formatos

PorCyntia Calhado

15/09/2016

Com o apoio da prefeitura ao projeto, a escola criou um minimuseu de cinema, com filmadoras e projetores

Com câmeras emprestadas e celulares, os alunos do IEE Gomes Jardim, em Guaíba, na região metropolitana de Porto Alegre, filmam histórias de suspense, amor e comédia, peças publicitárias, telejornais, documentários e animações. Eles convidam amigos e parentes para atuar, fazem a maquiagem e escolhem o figurino e a locação. As produções são exibidas no Festival de Vídeo Estudantil e Mostra de Cinema - promovido pela escola - e alguns até premiados.

A iniciativa faz lembrar cursos profissionalizantes de cinema, mas é o resultado de uma proposta pedagógica que integra as disciplinas de Arte e Filosofia, desenvolvida desde 2002 com estudantes de todo o Ensino Médio por Valmir Michelon, que leciona ambas.

Esse é um bom exemplo de como os professores da área de Linguagens (que inclui Língua Portuguesa, Língua Estrangeira, Arte e Educação Física) podem estimular a produção de textos em suas diferentes formas e o envolvimento dos jovens com as atividades propostas - essencial para que aprendam - a interpretar, confrontar ideias e compreender o significado de mensagens mais complexas. "Projetos interdisciplinares, pautados por metodologias que incluam o diálogo e uma postura ativa dos educandos, como o de Guaíba, são uma alternativa eficaz para ampliar as competências discursivas frente às novas configurações de texto", diz Clecio Bunzen, da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp).

O trabalho da Gomes Jardim começa com aulas sobre fotografia, história do cinema e publicidade, em que os alunos são estimulados a fazer análises críticas de produções audiovisuais, como Cinema Paradiso, de Giuseppe Tornatore Na parte prática, eles têm noções sobre enquadramento e linguagem visual e aprendem a manipular a filmadora e a câmera fotográfica. Os alunos também fotografam com uma câmera pinhole, feita de lata, e revelam as fotos em laboratório.

É parte importante do conteúdo a elaboração dos roteiros dos vídeos, que são produzidos e exibidos no festival anual, sempre em novembro. Um dos objetivos da proposta é fornecer elementos para que os estudantes analisem programas de TV e filmes. Ao longo dos anos, segundo Michelon, a postura crítica dos jovens com relação aos audiovisuais melhorou muito. "A criação dos vídeos em sala aumentou também a participação e o interesse deles nas aulas", diz a produtora Michelle Villanova, 25 anos, ex-aluna da escola, premiada na primeira edição do festival com o telejornal de ficção JN Especial: As Bactérias.

O festival acabou ganhando o apoio da prefeitura e, há três anos, foi criado um minimuseu de cinema, com filmadoras e projetores, e uma sala de exibição dentro da escola. Além de sediar o festival, o Cine Teatro Gomes Jardim exibe filmes para toda a cidade, que até então não tinha cinema. "A tecnologia é muito presente no cotidiano dos jovens. O que fiz foi incorporar essa vivência em sala", afirma o professor.

Para Roxane Rojo, do Departamento de Linguística Aplicada da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), as tecnologias atuais exigem do leitor e produtor de texto novas habilidades. Além de ler e escrever, é necessário compreender o significado de mensagens mais complexas, que integram texto verbal e informação sonora e visual. "As propostas que trabalham a articulação de diversas formas de textos são adequadas às necessidades das práticas contemporâneas."

 

Capacitação e novo projeto são a base da mudança

O professor Wagner Siqueira trabalha os vários gêneros textuais e seus usos e orienta os estudantes a pesquisar em casa e na biblioteca

O projeto Penso, Logo Escrevo, criado por Wagner Garcia Siqueira, que leciona Língua Portuguesa na EE Professora Ruth Cabral Troncarelli, na capital paulista, também aposta na participação e na postura ativa dos alunos. Com objetivos claros e metodologia definida, ele conseguiu reverter os péssimos resultados de suas turmas na produção de texto. O professor pensou no projeto durante a correção de redações feitas para o Sistema de Avaliação de Rendimento Escolar (Saresp), quando se deparou com folhas em branco, textos com ideias desconexas e inúmeros erros gramaticais.

Nas aulas de Siqueira, os temas das composições semanais são sugeridos e votados pela turma. "Os textos são desenvolvidos com base na experiência de vida dos jovens", diz. Um dos assuntos trabalhados foi o sistema carcerário no Brasil. Os relatos de alguns adolescentes sobre os dramas de conhecidos presos sensibilizaram outros, que expuseram suas ideias com relação à pena de morte e a ações mais violentas da polícia.

Uma vez escolhido o assunto, o professor promove um debate em classe durante o qual todos apresentem o que sabem sobre ele. Para que os estudantes ampliem seu conhecimento, ele seleciona materiais que ajudam na problematização e no aprofundamento do tema e os apresenta em classe. Além disso, orienta a realização de pesquisas em casa e na biblioteca. Após trabalhar com a garotada os vários gêneros textuais - como editorial, artigo, entrevista e carta - e seus usos, ele define quais serão trabalhados.

Antes de partir para a escrita dos textos, os jovens discutem o vocabulário específico relacionado ao assunto e, se julgarem pertinente, criam um minidicionário. A etapa seguinte consiste na revisão. Em duplas, eles apontam erros ortográficos e gramaticais e avaliam a coerência das produções dos colegas com base nas orientações do professor.

A seguir, o foco passa a ser a leitura e a argumentação oral. Os textos são lidos para os colegas e a classe toda conversa novamente sobre o que abordam e a organização deles. Depois que todos reescrevem suas composições, o professor aplica questionários de autoavaliação com o objetivo de levar os estudantes a refletir sobre o trabalho e os progressos pessoais na escrita. No último bimestre, a turma seleciona e digitaliza os melhores textos, que são arquivados e podem ser publicados no site pensologoescrevo.org e lidos durante um evento anual, aberto à comunidade escolar.

O objetivo do projeto era fazer com que, em um ano, 90% dos alunos fossem capazes de redigir textos coerentes e com menos erros. De acordo com Siqueira, a missão foi plenamente cumprida.

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