Passeamos pela exposição Oswald de Andrade: o culpado de tudo, em cartaz no Museu da Língua Portuguesa, em São Paulo, para lembrarmos a trajetória deste que foi um dos maiores agitadores culturais do Brasil de todos os tempos. Junto de outros modernistas ? como Mário de Andrade, Anita Malfatti, Menotti Del Picchia, Tarsila do Amaral, Villa-Lobos, Guilherme de Almeida ? Oswald mudou nosso olhar sobre a cultura brasileira e agitou o Theatro Municipal de São Paulo na Semana de Arte Moderna, em 1922.
Meu nome é Oswáááld Oswald de Andrade nasceu em 1890. Paulistano, viveu no bairro do Brás e no centro da cidade. Seu nome foi dado pela avó, Dona Antônia, inspirada pelo personagem Oswald, de um romance francês intitulado Corina, escrito por Madame de Staël. Por isso, a pronúncia 'correta' do nome do escritor e expoente do modernismo literário brasileiro é Oswáld (à francesa) e não Ôswald (à inglesa), como nos habituamos a chamá-lo. Esta história está detalhada no livro de memórias do escritor, chamado Um homem sem profissão. Sobre a formação de uma identidade nacional No início do século 20, a elite brasileira apoiava-se culturalmente nos hábitos e pensamentos estrangeiros. A proposta de Oswald de Andrade para renovar a cultura brasileira não era a de rejeitar os conhecimentos do povo europeu, mas apropriar-se deles para criar algo novo, adequado à identidade do povo brasileiro. Por sua obra e por suas atitudes ousadas para a época ele foi considerado o mais ?rebelde? dentre os modernistas. O culpado de tudo O título da exposição sobre a vida e a obra de Oswald, em cartaz no Museu da Língua Portuguesa até o dia 26 de fevereiro de 2012 em São Paulo, foi extraído do livro póstumo Dicionário de Bolso. Na obra, Oswald cria verbetes para definir personagens históricos. Para o escritor, Cabral é o verdadeiro ?culpado de tudo?, assim como o amigo Mário de Andrade era ?Macunaíma traduzido?. Os modernistas Muitos dos idealizadores da Semana de Arte Moderna de 1922 faziam parte da burguesia paulistana. Eles se reuniam em salões literários e em mansões na região da Avenida Paulista. Alguns, como Menotti Del Picchia e Plínio Salgado estavam, inclusive, diretamente envolvidos com o PRP - o Partido Republicano Paulista. De acordo com Marcia Camargos, autora do livro Semana de 22: entre vaias e aplausos, o modernismo condensado na Semana unia vanguarda, folclore e urbanismo. A Semana de Arte Moderna Realizada nos dias 13, 15 e 17 de fevereiro de 1922 no Theatro Municipal de São Paulo, a Semana deu visibilidade às ideias modernistas. Para intelectuais como Mário e Oswald de Andrade, o moderno nas artes visuais, na literatura e na música correspondia ao fortalecimento da identidade brasileira da época, sem deixar de manter alguns laços com as correntes artísticas estrangeiras. A programação da Semana de 1922 Acima, a programação de um dos dias de Semana de Arte Moderna, com a leitura de poemas de Menotti Del Picchia - escritor, poeta e jornalista do Correio Paulistano - e um recital da pianista Guiomar Novaes, com obras de Heitor Villa-Lobos e do compositor impressionista francês, Claude Debussy, ídolo dos modernistas. Elite moderna Oswald de Andrade (de casaco mais claro) e Tarsila do Amaral (a segunda, da esquerda para a direita) junto de amigos e apoiadores do movimento modernista no Jardim da Luz, em São Paulo. Ao fundo, a vista do jardim hoje. A fotografia está no Museu da Língua Portuguesa e faz parte da exposição 'Oswald de Andrade: o culpado de tudo'. As mulheres de Oswald Kamiá, Julieta, Tarsila, Pagu, Maria Antonieta... Ao longo da vida, Oswald de Andrade teve sete mulheres e cada uma delas marcou, de forma singular, a trajetória do escritor. Com Tarsila, Oswald consagrou a fase modernista; com Pagu - a escritora Patrícia Galvão -, o lado comunista e militante ganhou força; e com Maria Antonieta D?Alkmin, mãe de seus filhos caçulas, vieram os dias mais tranquilos. Oswald e a poesia As marcas da oralidade e da cultura popular estão amplamente presentes na poesia de Oswald de Andrade. Com seus versos livres, utilizados também por outros modernistas, ele deixou uma herança que mudou definitivamente o modo de se fazer poesia e literatura no Brasil. Até então a prosa e a poesia brasileiras eram marcadas por elementos do parnasianismo. ?Aprendi com meu filho de dez anos/ Que a poesia é a descoberta/ Das coisas que eu nunca vi?, escreveu. Oswald contestador Para Oswald de Andrade ?contestar é um dever da inteligência?. Antes, durante e depois da Semana Moderna, ele questionou o modo como aceitávamos a cultura estrangeira e a forma como escrevíamos nossa prosa e poesia. Não por acaso, conseguiu que a Semana fosse realizada em São Paulo (e não no Rio de Janeiro que, na época, era o local de maior efervescência cultural do país) justamente no centenário da Independência do Brasil. Isso, claro, com a ajuda dos demais modernistas e de mecenas, como Paulo Prado. Tupi or not Tupi Oswald quebrou tabus, questionou a identidade cultural do povo brasileiro e estimulou que nos aproveitássemos dos conhecimentos de várias culturas para criarmos algo novo e adequado ao nosso povo. Na imagem acima, notas de mil cruzeiros, estampadas com o rosto de Pedro Álvares Cabral, são carimbadas com a definição ?O culpado de tudo?. Foi assim que o escritor caracterizou o descobridor do Brasil ao recontar a história ironicamente na obra Dicionário de Bolso. De herdeiro a endividado Com o progresso industrial de São Paulo, no início do século 20, o pai de Oswald de Andrade enriqueceu com a especulação imobiliária. Filho único, Oswald herdou grandes proporções de terra na cidade (todo o bairro de Pinheiros, do Jóquei Clube até a região onde hoje está o Hospital das Clínicas). Ao longo da vida, o escritor conseguiu acabar com a fortuna e ainda deixou uma dívida que demorou mais de dez anos para ser paga por seu filho Nonê. Heranças do modernismo A obra de Oswald incorporava inúmeros elementos da cultura popular de sua época. Ele e outros modernistas deixaram uma herança sólida para a música, a poesia e a literatura produzidas atualmente. Por isso, na exposição em cartaz no Museu da Língua Portuguesa, em São Paulo, alguns poemas e neologismos criados por Oswald estão expostos como grafitis. Poesia Pau-Brasil Inspirado pelo Manifesto Futurista de Marinetti (de 1909), Oswald de Andrade lançou seu primeiro manifesto modernista, o Manifesto da Poesia Pau-Brasil, publicado em 18 de março de 1824 nas páginas do Correio da Manhã. Em tom festivo, Oswald pregava uma nova forma de expressão, mais sintética - tal qual as vanguardas artísticas europeias, como o cubismo - e mais primitiva. Ele queria que a arte brasileira se tornasse um produto digno de exportação, assim como as árvores de Pau-Brasil. Manifesto Antropófago ?Só me interessa o que não é meu. Lei do homem. Lei do Antropófago?. Neste manifesto, lido em 1928 na casa de Mário de Andrade e publicado na Revista de Antropofagia, que Oswald criou junto de Raul Bopp e de Alcântara Machado, o escritor propunha que devorássemos, simbolicamente, todos os costumes de outros povos que servissem para fortalecer a cultura genuinamente brasileira. A palavra antropofagia veio de um ritual indígena em que os vencedores alimentavam-se da carne dos vencidos para apropriar-se de sua força. O legado de Oswald Oswald de Andrade escreveu livros de prosa, poesia e peças teatrais, cujos ecos são perceptíveis em produções brasileiras atuais. Dentre suas obras mais importantes pode-se destacar o Primeiro caderno do aluno de poesia Oswald de Andrade, Pau Brasil, O Homem do Povo, O Rei da Vela, Serafim Ponte Grande, Memórias Sentimentais de João Miramar, Dicionário de Bolso e A Utopia Antropofágica. Pelo direito de ser traduzido e deformado A frase, retirada da página 54 do livro Serafim Ponte Grande, é uma das citações que mais sintetiza o pensamento modernista e antropofágico de Oswald de Andrade. Tudo pode ser aproveitado e incorporado à cultura nacional. A faixa está na entrada do Museu da Língua Portuguesa, que abriga uma exposição sobre o escritor até o dia 26 de fevereiro de 2012.
EXPOSIÇÃO Oswald de Andrade: o culpado de tudo
Em cartaz até 26 de fevereiro de 2012 no Museu da Língua Portuguesa, em São Paulo De terça a domingo, das 10h às 18h (a bilheteria fecha às 17h30)
Endereço: Praça da Luz, s/nº, Centro, São Paulo Telefone para agendamento de visitas guiadas: (11) 3326-0775 www.museudalinguaportuguesa.org.br Ingresso: R$ 6,00. Estudantes com carteira de estudante do ano e documento de identidade pagam meia-entrada. Crianças com até 10 anos e idosos a partir de 60 anos não pagam ingresso, bem como professores da rede pública.