Desastres naturais: estudo e prevenção
A sala se engajou no aprendizado da Geografia física ao conhecer o assunto
01/10/2014
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Jornalismo
01/10/2014
Em 2004, quando um tsunami no Oceano Índico atingiu a costa de 11 países e matou milhares de pessoas, um caso se sobressaiu: uma menina de 10 anos teria conseguido salvar uma centena de turistas. Usando o que aprendeu nas aulas de Geografia, a britânica Tilly Smith identificou a aproximação da onda gigante e alertou a família e outros cidadãos numa praia no sul da Tailândia. A professora Monique Godoi Gomes Lescura acompanhou a repercussão do caso. "Quando vi a notícia, pensei o que teria acontecido se um aluno meu estivesse no lugar daquela garota", conta. Foi assim que surgiu a ideia de trabalhar com desastres naturais e métodos de prevenção nas turmas de 8°ano da EM CAIC, em Lorena, a 190 quilômetros de São Paulo.
Ao pesquisar, analisar gráficos, tabelas e mapas, e sair a campo, os estudantes aprenderam conceitos fundamentais de climatologia, relevo, hidrografia e outros conteúdos importantes de Geografia física. "O uso de um tema aglutinador, que desperta o interesse dos jovens, fez com que a educadora favorecesse a apropriação do conhecimento", analisa Sueli Furlan, professora do Departamento de Geografia da Universidade de São Paulo (USP).
Mas, para abordar o assunto, Monique teve de se debruçar sobre livros e mergulhar a fundo na expansão dos seus conhecimentos. Para isso, buscou fontes que considerava confiáveis, como os sites do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais e os cadernos de Educação Ambiental organizados pela Secretaria do Meio Ambiente do Estado de São Paulo. Esse estudo foi fundamental para o bom desenvolvimento do projeto. "Muitos professores deixam de tratar desses temas justamente porque conhecem pouco sobre eles", ressalta Ercília Torres, docente da Universidade de Brasília (UnB).
O estudo pede mãos à obra
O trabalho começou por uma sondagem das informações que os alunos já possuíam. "Percebi que eles conheciam e identificavam apenas os eventos de grande magnitude, como terremotos, tsunamis e vulcões. Outros fenômenos, mais próximos da realidade deles, como chuva, queda de granizo e alagamento, não foram sequer citados", conta Monique. Durante as discussões iniciais feitas pela docente, os principais conceitos foram escritos no quadro à medida que o bate-papo seguia para que todos começassem a se familiarizar com o tema.
A sala foi, então, dividida em grupos de três ou quatro integrantes, que pesquisaram e apresentaram informações sobre tópicos como diferentes tipos de desastres naturais, épocas em que ocorrem e formas de prevenção. "Nessas situações, é interessante que os estudantes discutam bastante e façam perguntas. Isso acontece quando eles já têm alguns conhecimentos consolidados sobre o tema", diz Sueli. A rodada de apresentações terminou com conversas sobre vídeos selecionados, que aprofundaram ainda mais o conteúdo.
Na etapa seguinte, a turma analisou diversos mapas, tabelas e gráficos: primeiramente do mundo todo; depois apenas do estado de São Paulo. A docente instruiu os jovens a investigar os fenômenos mais comuns nos locais estudados e a explicar suas causas. "Muita gente acha que todos acontecem em qualquer lugar. É importante mostrar que as ocorrências são regionalizadas e o uso de duas escalas, global e local, é válido", explica Sueli. Para cumprir a tarefa, a garotada precisou expandir os conhecimentos sobre Geografia física: os desastres naturais são consequências de fenômenos desencadeados pelo clima, pela vegetação, pelo tipo de solo de cada local etc (veja o mapa abaixo e acesse aqui). Ercília exemplifica: "Ao abordar terremotos, temos de estudar placas tectônicas, relevos, rochas e clima. Já ao tratar de furacões, precisamos compreender as massas de ar, os sistemas atmosféricos e as estações do ano".
As discussões se estabeleceram, desta vez, por grupos montados com foco no quesito produtividade. "No acompanhamento feito por minha coordenadora pedagógica, ela me explicou que seria interessante deixar de lado o agrupamento por afinidade e reunir os alunos de acordo com seus conhecimentos", conta Monique. Assim, as equipes foram organizadas por integrantes que possuíam diferentes níveis de conhecimento, mas próximos, para que pudessem avançar no estudo. A turma se apoiou em anotações feitas durante as aulas e nos materiais disponibilizados. "No ano passado, já tínhamos trabalhado com gráficos, então, aplicamos esse aprendizado às informações sobre os diferentes países que a professora nos passou", conta a aluna Fernanda Capeletti Santos, 12 anos. Os resultados dos debates foram divididos com o resto da classe.
Os jovens também realizaram, individualmente, um estudo de caso. Monique selecionou uma notícia da internet sobre deslizamentos ocorridos na região serrana do Rio de Janeiro, em 2011, e pediu que os estudantes elaborassem um texto explicando o tipo de desastre ocorrido e suas prováveis causas e ações de prevenção da defesa civil (responsável por lidar com esses acontecimentos). "Ao analisar um fenômeno específico, é possível revisitar os conteúdos já vistos e aprofundar ainda mais o conhecimento", conta Sueli.
Para concluir as análises, os jovens aliaram o conhecimento teórico à experiência de quem vive no cenário dos eventos: eles pesquisaram imagens (feitas por familiares ou retiradas da internet) de desastres naturais acontecidos em Lorena. Os materiais foram apresentados à turma, que discutiu mais uma vez sobre as causas e consequências. "Uma aluna descobriu, por exemplo, que no início do século 20 uma enchente alterou o curso do Rio Paraíba do Sul, que fica próximo à cidade. Isso fez com que o município crescesse de costas para a Igreja Matriz, diferentemente do que costuma acontecer", conta a professora.
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Aprendizado in loco com especialistas
Ao avaliar as atividades e os registros feitos pelos alunos, Monique percebeu que alguns tópicos precisariam ser tratados novamente, como as formas de prevenção de fenômenos naturais. "Eles ainda não haviam compreendido o papel e o funcionamento das geotecnologias usadas para monitorar locais de risco e avisar quando desastres podem ocorrer", esclarece a docente. Uma visita ao Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) e ao Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden), já planejada no início do projeto, serviu para fixar esses conhecimentos.
A professora explicou a saída a campo aos estudantes e os orientou sobre um relatório de visita que precisaria ser elaborado por cada um deles. O material deveria conter informações como o nome e a função de todos os especialistas com quem conversassem, assim como os principais tópicos apresentados por eles. Monique também avisou a classe que, ao retornarem para a escola, eles teriam de escrever uma carta ao prefeito para tratar justamente das medidas de prevenção de desastres na cidade. Dessa forma, a turma saiu preparada para coletar os dados de que precisariam utilizar depois.
Na visita, os jovens conheceram os instrumentos usados para o monitoramento de áreas de risco, assim como o trabalho dos profissionais responsáveis por essa tarefa. Assim, puderam ver, na prática, como funcionam as geotecnologias, fazendo com que finalmente se apropriassem desse conteúdo. "Os técnicos nos apresentaram o pluviômetro, que é um importante instrumento para medir a chuva e para prevenir alagamentos e deslizamentos. Esse aparelho é distribuído para todas as prefeituras que o solicitam, mas nós descobrimos que aqui em Lorena nenhum pedido foi feito, apesar desses problemas naturais serem bem frequentes na cidade", conta o estudante Luís Gabriel Clemente, 13 anos.
De volta à sala, foi hora de encerrar o trabalho: os alunos elaboraram mensagens ao prefeito, solicitando explicações e sugerindo soluções para minimizar os efeitos de desastres no município. Dessa forma, eles puderam colocar em prática todos os conhecimentos adquiridos sobre o tema. Uma das cartas foi eleita pela turma para ser enviada. Algumas semanas depois, a escola recebeu a resposta da prefeitura, informando as medidas que já estavam sendo tomadas.
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