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Jornalismo

A aula de Português do futuro já existe e é aqui

Com uma TV online, o professor Jorge Cesar Barboza trabalhou conteúdos como gramática, produção textual e oralidade

PorAna Ligia Scachetti

01/03/2013

Aulas do professor Jorge Cezar Barbosa Coelho em Campo Bom. Foto: Tamires Koop Na sala de aula As aulas do professor Jorge Cesar Barboza Coelho utilizam vários recursos da lousa digital e de outros equipamentos. Com eles, o educador envolve a turma e apresenta conteúdos de Língua Portuguesa que emergem durante a produção das reportagens. A turma se divide em grupos e trabalha em 'ilhas', da mesma maneira que as redações jornalísticas de canais de televisão e veículos de comunicação impressos que eles visitaram na região. Notebooks e máquinas fotográficas se aliam aos dicionários e cadernos. Foto: Tamires Koop Como uma redação A turma se divide em grupos e trabalha em 'ilhas', da mesma maneira que as redações jornalísticas de canais de televisão e veículos de comunicação impressos que eles visitaram na região. Notebooks e máquinas fotográficas se aliam aos dicionários e cadernos. Todos apresentam suas sugestões para os temas a serem abordados nas reportagens e decidem em conjunto. As notícias abordam assuntos da cidade e também da realidade dos adolescentes. Foto: Tamires Koop Reunião de pauta Todos apresentam suas sugestões para os temas a serem abordados nas reportagens e decidem em conjunto. As notícias abordam assuntos da cidade e também da realidade dos adolescentes. Os integrantes da CBB WebTV têm uma autorização especial para utilizar celulares e o telefone da escola. Assim, podem agendar as entrevistas a serem realizadas. Foto: Tamires Koop Organização Os integrantes da CBB WebTV têm uma autorização especial para utilizar celulares e o telefone da escola. Assim, podem agendar as entrevistas a serem realizadas. Espaços públicos da cidade de Campo Bom, como o parque do Complexo Cultural CEI, são frequentemente foco das notícias apresentadas pela turma da TV online. Foto: Tamires Koop Gravação Espaços públicos da cidade de Campo Bom, como o parque do Complexo Cultural CEI, são frequentemente foco das notícias apresentadas pela turma da TV online. Uma sala de aula foi adaptada para abrigar os trabalhos da equipe da CBB WebTV. Nela, os alunos gravam vídeos com comentários sobre filmes, livros e videogames. Foto: Tamires Koop Estúdio Uma sala de aula foi adaptada para abrigar os trabalhos da equipe da CBB WebTV. Nela, os alunos gravam vídeos com comentários sobre filmes, livros e videogames. O programa Windows Movie Maker é utilizado pela turma para editar os vídeos. Alguns estudantes, que já conheciam a ferramenta, ensinaram para os demais. Foto: Tamires Koop Software O programa Windows Movie Maker é utilizado pela turma para editar os vídeos. Alguns estudantes, que já conheciam a ferramenta, ensinaram para os demais. Antes de veicular as produções na internet, todos assistem os vídeos juntos e analisam o que está bom e o que pode ser melhorado. Em muitos casos, uma nova edição é realizada para fazer os ajustes. Foto: Tamires Koop Avaliação Antes de veicular as produções na internet, todos assistem os vídeos juntos e analisam o que está bom e o que pode ser melhorado. Em muitos casos, uma nova edição é realizada para fazer os ajustes. Além dos vídeos, os alunos também escrevem uma introdução para as reportagens e publicam no site da TV e nas redes sociais. Assim, divulgam as novidades para seus telespectadores. Foto: Tamires Koop Textos online Além dos vídeos, os alunos também escrevem uma introdução para as reportagens e publicam no site da TV e nas redes sociais. Assim, divulgam as novidades para seus telespectadores.

Quando a aula de Jorge Cesar Barboza Coelho vai começar na EMEF Borges de Medeiros, em Campo Bom, a 50 quilômetros de Porto Alegre, a turma já sabe: o primeiro passo é reorganizar a sala. As carteiras são unidas em grupos e viradas para a lousa digital. Um aluno auxilia o docente com os equipamentos e outro anota os aspectos principais dos conteúdos abordados. Uma minilousa circula entre as mesas e permite que os estudantes façam anotações, que aparecem automaticamente no quadro principal. Máquinas fotográficas, notebooks e, claro, dicionários e cadernos completam o cenário do que eles chamam de redação digital.

As carteiras agrupadas são inspiradas nas ilhas de trabalho que a classe viu ao visitar as redações de veículos de comunicação da região. E todos os equipamentos estão a serviço da CBB WebTV, uma TV veiculada na internet, base para o aprendizado dos conteúdos de Língua Portuguesa do 9º ano (confira as etapas do trabalho nas imagens da galeria). "O principal aspecto do projeto é a existência de uma situação real", avalia Coelho. "Os alunos produzem para um interlocutor que não é o professor ou seu colega. É o público da TV. Assim, ficam mais motivados e atentos às suas escolhas lexicais."

Sérgio Amaral, coordenador do Laboratório de Novas Tecnologias Aplicadas na Educação (Lantec), da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), lembra que o adolescente de hoje tem iniciativa e pode ser ativo no aprendizado. "A didática na classe tem de abrir espaço para esse protagonismo. Se você proíbe o uso de equipamentos como o celular, distancia a sala do que é vivido fora dali. Com aulas participativas e com propósito claro, o aluno dá novo sentido à necessidade de aprender."

Curti

Vitória Tavares, 15 anos. Foto: Tamires Kopp

"Nas aulas, a gente conversava e aprendia de uma maneira descontraída sobre pontuação e tom de voz, por exemplo." 

Vitória Tavares, 15 anos

Por dentro da redação digital

 . Foto: Tamires Kopp
Aula na sala A lousa digital e outros equipamentos colaboram para a discussão de conteúdos ligados à produção de reportagens

Nas ilhas de trabalho, se alguém tem dificuldades, os demais podem seguir com as atividades enquanto o professor faz um atendimento individual. As tarefas são divididas conforme a predileção de cada um: alguns ficam em frente às câmeras, outros fotografam ou filmam e ainda há os que publicam e descrevem os vídeos no site do projeto (cbbwebtv.wordpress.com) e nas redes sociais. O envolvimento é tanto que nem parece a mesma turma encontrada por Coelho. Os alunos escreviam bem, mas não entendiam por que isso era importante.

Ao produzir as reportagens, os jovens praticam o gênero notícia, redigem textos argumentativos para os comentários que serão lidos em frente à câmera e elaboram resenhas sobre filmes, livros e videogames. Acima de tudo, atestam as diferenças entre escrita e oralidade e a adequação a cada suporte (impresso, audiovisual e online) e público.

Desde o início, os estudantes perceberam que, se não planejavam o que seria dito no vídeo, eram traídos pela velocidade da fala. Decidiram, então, registrar tudo por escrito e revisar antes de gravar. Escolhas como essa não foram impostas, e sim tomadas em conjunto. "O professor deve cuidar do aprendizado, mas não sozinho. Ele tem de dividir responsabilidades com seus alunos", lembra Coelho.

Durante 2011, o educador e os estudantes formaram uma equipe. A cada aula, ele trazia três possíveis conteúdos da disciplina e a turma escolhia um deles. Além disso, debatiam em reuniões os rumos da atividade. "Ele mudou paradigmas do ensino de Língua Portuguesa com o uso da tecnologia", diz Rita Jover-Faleiros, do Instituto de Letras da Universidade de Brasília (UnB). "Os jovens tomaram decisões e o professor mediou o aprendizado."

Parte dos equipamentos usados na CBB WebTV foi fornecida pela prefeitura - que também oferece internet gratuita para a população - e outros obtidos com recursos do Programa Nacional de Informática na Educação (Proinfo). A Secretaria Municipal teve de autorizar três questões: o aproveitamento de notebooks destinados aos docentes e que ficavam guardados, o uso do celular na sala de aula e a participação dos alunos em redes sociais.

"Muitas escolas ainda possuem poucos computadores e, se o professor só pode utilizar a máquina de vez em quando, não consegue desenvolver um projeto com a presença tão intensa e contínua de tecnologia", aponta Betina Von Staa, pesquisadora de tecnologias educacionais, da empresa D2L Brasil. Mas, para que o uso dos equipamentos faça sentido, ela alerta que é primordial ter um objetivo de aprendizado específico. As ferramentas devem ser o meio para alcançar o fim pedagógico. Coelho tem isso bem claro, por isso seu projeto é tão bem-sucedido. Atualmente, a CBB WebTV é uma atividade oferecida no contraturno da escola e desenvolvida em outras escolas.

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