A aula de Português do futuro já existe e é aqui
Com uma TV online, o professor Jorge Cesar Barboza trabalhou conteúdos como gramática, produção textual e oralidade
01/03/2013
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Jornalismo
01/03/2013
Quando a aula de Jorge Cesar Barboza Coelho vai começar na EMEF Borges de Medeiros, em Campo Bom, a 50 quilômetros de Porto Alegre, a turma já sabe: o primeiro passo é reorganizar a sala. As carteiras são unidas em grupos e viradas para a lousa digital. Um aluno auxilia o docente com os equipamentos e outro anota os aspectos principais dos conteúdos abordados. Uma minilousa circula entre as mesas e permite que os estudantes façam anotações, que aparecem automaticamente no quadro principal. Máquinas fotográficas, notebooks e, claro, dicionários e cadernos completam o cenário do que eles chamam de redação digital.
As carteiras agrupadas são inspiradas nas ilhas de trabalho que a classe viu ao visitar as redações de veículos de comunicação da região. E todos os equipamentos estão a serviço da CBB WebTV, uma TV veiculada na internet, base para o aprendizado dos conteúdos de Língua Portuguesa do 9º ano (confira as etapas do trabalho nas imagens da galeria). "O principal aspecto do projeto é a existência de uma situação real", avalia Coelho. "Os alunos produzem para um interlocutor que não é o professor ou seu colega. É o público da TV. Assim, ficam mais motivados e atentos às suas escolhas lexicais."
Sérgio Amaral, coordenador do Laboratório de Novas Tecnologias Aplicadas na Educação (Lantec), da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), lembra que o adolescente de hoje tem iniciativa e pode ser ativo no aprendizado. "A didática na classe tem de abrir espaço para esse protagonismo. Se você proíbe o uso de equipamentos como o celular, distancia a sala do que é vivido fora dali. Com aulas participativas e com propósito claro, o aluno dá novo sentido à necessidade de aprender."
Curti
"Nas aulas, a gente conversava e aprendia de uma maneira descontraída sobre pontuação e tom de voz, por exemplo."
Vitória Tavares, 15 anos
Por dentro da redação digital
Nas ilhas de trabalho, se alguém tem dificuldades, os demais podem seguir com as atividades enquanto o professor faz um atendimento individual. As tarefas são divididas conforme a predileção de cada um: alguns ficam em frente às câmeras, outros fotografam ou filmam e ainda há os que publicam e descrevem os vídeos no site do projeto (cbbwebtv.wordpress.com) e nas redes sociais. O envolvimento é tanto que nem parece a mesma turma encontrada por Coelho. Os alunos escreviam bem, mas não entendiam por que isso era importante.
Ao produzir as reportagens, os jovens praticam o gênero notícia, redigem textos argumentativos para os comentários que serão lidos em frente à câmera e elaboram resenhas sobre filmes, livros e videogames. Acima de tudo, atestam as diferenças entre escrita e oralidade e a adequação a cada suporte (impresso, audiovisual e online) e público.
Desde o início, os estudantes perceberam que, se não planejavam o que seria dito no vídeo, eram traídos pela velocidade da fala. Decidiram, então, registrar tudo por escrito e revisar antes de gravar. Escolhas como essa não foram impostas, e sim tomadas em conjunto. "O professor deve cuidar do aprendizado, mas não sozinho. Ele tem de dividir responsabilidades com seus alunos", lembra Coelho.
Durante 2011, o educador e os estudantes formaram uma equipe. A cada aula, ele trazia três possíveis conteúdos da disciplina e a turma escolhia um deles. Além disso, debatiam em reuniões os rumos da atividade. "Ele mudou paradigmas do ensino de Língua Portuguesa com o uso da tecnologia", diz Rita Jover-Faleiros, do Instituto de Letras da Universidade de Brasília (UnB). "Os jovens tomaram decisões e o professor mediou o aprendizado."
Parte dos equipamentos usados na CBB WebTV foi fornecida pela prefeitura - que também oferece internet gratuita para a população - e outros obtidos com recursos do Programa Nacional de Informática na Educação (Proinfo). A Secretaria Municipal teve de autorizar três questões: o aproveitamento de notebooks destinados aos docentes e que ficavam guardados, o uso do celular na sala de aula e a participação dos alunos em redes sociais.
"Muitas escolas ainda possuem poucos computadores e, se o professor só pode utilizar a máquina de vez em quando, não consegue desenvolver um projeto com a presença tão intensa e contínua de tecnologia", aponta Betina Von Staa, pesquisadora de tecnologias educacionais, da empresa D2L Brasil. Mas, para que o uso dos equipamentos faça sentido, ela alerta que é primordial ter um objetivo de aprendizado específico. As ferramentas devem ser o meio para alcançar o fim pedagógico. Coelho tem isso bem claro, por isso seu projeto é tão bem-sucedido. Atualmente, a CBB WebTV é uma atividade oferecida no contraturno da escola e desenvolvida em outras escolas.
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