Já imaginou ver estudantes de Ensino Fundamental 2 e Ensino Médio investigando personagens que construíram a história do país em documentos históricos, livros e fotografias? Incentivar os alunos a serem protagonistas da busca pelo conhecimento histórico permite que eles desenvolvam uma atitude crítica e contribui para a leitura de mundo que fazem do seu entorno.
A Base Nacional Comum Curricular (BNCC) apresenta cinco processos - identificação, comparação, contextualização, interpretação e análise – que incentiva a atitude historiadora. “Não adianta uma pessoa apenas conseguir identificar um problema. Ela precisa identificar, comparar soluções para esse problema, contextualizar esse problema (‘bom, isso já aconteceu antes’), interpretar as partes desse problema, e por fim, analisar para conseguir chegar a uma solução”, explica Sherol dos Santos, doutoranda em História na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), formadora e professora na rede estadual do Rio Grande do Sul.
A educadora ressalta que não há uma hierarquia entre esses processos, mas que eles podem ocorrer simultaneamente ou separadamente. “Depende da faixa etária dos estudantes e dos propósitos do professor. No entanto, a atitude historiadora é fundamental para que essa visão crítica seja ampliada para além da sala de aula”.
Aprenda a planejar aulas de História alinhadas à BNCC
Neste curso, você entenderá como planejar uma aula alinhada à BNCC, como colocar o aluno no papel de historiador e incluir metodologias ativas na sua práticas.
Mas, como fazer isso na prática? A Olimpíada Nacional em História do Brasil (ONHB), projeto de extensão da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), conduz há mais de uma década uma experiência nesses moldes. Nessa competição que envolve escolas de todo o país, estudantes de 8º e 9º anos do Ensino Fundamental e do Ensino Médio têm a oportunidade de trabalhar temas históricos fundamentais de forma inovadora, cumprindo diferentes tarefas que envolvem pesquisa historiográfica direta.
“A ONHB evidencia que História não é só estudar nomes de personagens, datas e acontecimentos; mas sim, se apropriar de um modo de fazer, de conhecer e de pensar, baseado na perspectiva de fazer relações, e na leitura de fontes e documentos”, sintetiza Sonia Regina Miranda, professora titular da Faculdade de Educação da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), “além disso, ela tem dado destaque à produção feita nas escolas públicas – mostrando que há muito valor e muita consistência nessas instituições”.
O trabalho de orientação na ONHB
Uma das etapas da edição 2019 da ONHB tinha como tema “Excluídos da História”. As equipes precisaram pesquisar e produzir artigos com personagens raramente estudados na historiografia tradicional. O resultado foi tão expressivo que a organização disponibilizou recentemente os 2,2 mil verbetes produzidos pelos estudantes de todo o país.
O professor Gerardo Júnior, que leciona História para Ensino Médio no Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Norte (IFRN) em Mossoró (RN) e que coordena equipes participantes do evento desde 2010, conta que em sua escola mais de 65 grupos participaram dessa tarefa. “Os estudantes tiveram a liberdade para pesquisar os personagens que quisessem, de acordo com os seus interesses e identificações”, conta. “As investigações se deram por pesquisas na internet e na biblioteca do IFRN, em conversas com parentes e conhecidos, e ainda, por meio de entrevistas com personagens ainda vivos”.
“Trabalhos como esse dão valor e visibilidade para histórias de todo o país, essencialmente no Nordeste, mostrando que a História que se faz nessa região tem transformado gerações e escolas”, explica Sonia. O professor Gerardo confirma esse propósito e relembra as produções dos seus alunos. “Os perfis produzidos apresentaram informações sobre diversos personagens que possuíam uma história desconhecida até mesmo por boa parcela da população do Rio Grande do Norte”, recorda. Os jovens pesquisaram sobre personagens como Alzira Soriano, a primeira prefeita eleita do Brasil e da América Latina; as feministas Nísia Floresta e Júlia Alves Barbosa Cavalcanti; Emmanuel Bezerra dos Santos, poeta e militante assassinado pela ditadura; a teatróloga Tony Silva; o sindicalista Chico Guilherme, entre muitos outros.
Investigando as histórias da família
No Fundamental 1 também é possível incentivar a atitude historiadora. Um caminho interessante é que os alunos investiguem a história da família e da comunidade. Neste Nova Escola Box, encontrará dicas e orientações que podem te ajudar a levar essa proposta para sua turma
Entre os ganhos de uma proposta como essa, Luis Fernando Cerri, professor no Departamento de História na Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG), aponta que o interessante desse tipo de proposta é incentivar uma visão crítica da História. “Quando a gente aborda a História nessa perspectiva, de colocar problemas e buscar nas fontes a solução, levantando hipóteses, alternativas e soluções possíveis, estamos experimentando agir e pensar como historiador”.
Estudantes e visão crítica da História: principais estratégias
Nesse processo de investigação dos alunos, o professor tem um papel mediar o processo de construção de conhecimento com os seus alunos. “Permite exercitar as metodologias ativas, como a sala de aula invertida, e possibilita o desenvolvimento de um ensino híbrido”, afirma o professor Gerardo.
A pesquisa dos estudantes pode se converter em um conhecimento, como foi o caso do exercício da ONHB. “O professor pode converter tudo em fonte [histórica]: do rótulo de produto em um supermercado ao cemitério, do noticiário de um jornal até os documentos oficiais governamentais”, indica.
Como replanejar as aulas de História?
Neste Nova Escola Box encontrará orientações para garantir as aprendizagens prioritárias nas aulas de História do Fundamental 2.
Por fim, Sherol também vê vantagens em revisitar o passado a partir de questões do presente. “Precisamos ir além dos grandes heróis, para além da História eurocêntrica e brancocentrada”, reforça a educadora. Para isso, além do uso de fontes históricas diretas, Sherol recomenda a composição de currículos de História pautados por questões pertinentes e presentes nas comunidades em que a escola está inserida. “Isso traz ganhos inclusive agora, na pandemia da covid-19. É possível falar sobre as pandemias mundiais, e abordar, por exemplo, como a comunidade se organiza em relação ao seu trabalho. Onde as pessoas da sua cidade, do seu estado, trabalham? Como estão lidando com isso agora, durante a pandemia, e como lidaram com isso em eventos anteriores? Essas são algumas reflexões possíveis”, conclui. Há diversas oportunidades e discussões relevantes que podem ser discutidas com as turmas dentro dessa perspectiva de incentivar uma postura ativa e investigação dos alunos.