Questão de escolha, agora e no futuro
Jovens gestantes ou mães adolescentes dificilmente terminam os estudos. O papel da escola é tentar evitar a gravidez e a evasão
30/04/2008
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Jornalismo
30/04/2008
? 20% dos bebês nascidos em 2006 são filhos de mães adolescentes.
? 25% das jovens de 15 a 17 anos que largam a escola o fazem por causa da gravidez.
? 72 meninas com menos de 14 anos dão à luz diariamente no país.
? 5% das mortes de garotas entre 10 e 19 anos são provocadas por problemas relacionados à gestação.
? 63% das alunas gestantes param de estudar. Só 40% voltam à escoladepois do parto.
FONTES: IBGE, UNESCO, MINISTÉRIO DA SAÚDE E HOSPITAL UNIVERSITÁRIO DA UnB
No ano passado, 500 mil crianças e adolescentes entre 10 e 19 anos deram à luz no Brasil. Pesquisa do Departamento de Pediatria do Hospital Universitário de Brasília indica que 63% das garotas que engravidam param de estudar e, delas, 60% abandonam de vez a escola ao tornar-se mães. Terceira causa de morte de jovens nessa faixa etária e principal motivo de evasão escolar entre as meninas, a maternidade precoce não preocupa apenas agentes de saúde em todo o país, mas também os educadores.
Para promover a conscientização sobre os riscos para a saúde e para a vida futura de uma gestação fora de hora, as salas de aula são locais privilegiados. Por isso, as escolas e as secretarias de Educação, em parceria com as pastas da saúde ou organizações não-governamentais (ONGs), desenvolvem programas de prevenção da gravidez e da evasão.
Os projetos são variados, mas as ações sempre começam envolvendo toda a escola. Isso porque ter uma aluna grávida na sala de aula não pode virar um drama nem gerar preconceito por parte dos colegas. O jovem precisa sentir-se responsável pelos próprios atos e livre para decidir seu futuro. É o único jeito de fazer com que as ações de esclarecimento funcionem, explica o psicólogo Antonio Carlos Egypto, especialista em Orientação Sexual e membro do Grupo de Trabalho e Pesquisa em Orientação Sexual (GTPOS), ONG da capital paulista que presta assessoria às escolas. Uma das ferramentas usadas para atingir o objetivo é discutir o futuro e de que maneira a opção pela maternidade ou pela paternidade poderia se encaixar ou não na vida do estudante (leia outras sugestões de ações preventivas no quadro ao lado).
Foi essa a estratégia adotada no Vale do Paraíba, no interior paulista, e nas redes de Alagoas e do Espírito Santo. Numa parceria entre a Secretaria Estadual de Educação e o Instituto Kaplan, de São Paulo, foi criado o projeto Vale Sonhar, que em dois anos reduziu em 90% a incidência de gravidez precoce na região, uma das mais pobres do estado. São realizadas três oficinas com todas as turmas a partir do 6º ano. A primeira trabalha com o projeto de vida, estimulando a garotada a sonhar com o amanhã e a imaginar como a maternidade ou a paternidade pode atrapalhar os planos, explica Narcisa Mendes, vice-diretora do EE Antônio Duarte de Castro, em Jacupiranga, a 220 quilômetros de São Paulo. No segundo encontro há explicações sobre o funcionamento do organismo, com jogos desenvolvidos especialmente para esse fim. Isso faz com que os estudantes conheçam melhor o próprio corpo e se respeitem fisicamente. No último são apresentados os métodos contraceptivos, a maneira de usá-los e onde encontrálos. Com essas informações, a turma começa a perceber que ter bebês é uma questão de escolha, completa Narcisa.
Para evitar a maternidade precoce
Algumas medidas podem ajudar a conscientizar os jovens e fazer com que eles pensem sobre o futuro:
? Procure a Secretaria de Educação e conheça os programas de Orientação Sexual ou prevenção disponíveis.
? Identifique na equipe os professores com desenvoltura para abordar o tema.
Invista em cursos de capacitação.
? Promova oficinas práticas sobre os meios contraceptivos e a maneira correta de usá-los.
? Envolva os estudantes para que se tornem multiplicadores dos métodos de prevenção entre os colegas.
? Desenvolva materiais informativos com os alunos, envolvendo-os em trabalhos e pesquisas.
? Aproveite as situações que aparecerem no dia-a-dia para falar sobre prevenção. A professora, uma colega de classe ou até mesmo uma artista conhecida engravidou? Use o fato como motivação.
? Estimule os jovens a formular idéias sobre o tema. Evite levar para a sala concepções preconcebidas ou uma visão dramática da situação.
Protagonismo juvenil
Outra medida que colabora para a diminuição do número de casos é a participação dos estudantes como agentes de conscientização. Em Santa Bárbara dOeste, a 130 quilômetros de São Paulo, os jovens atuam ao lado de educadores no planejamento e na execução das ações propostas em um projeto da Secretaria Municipal de Saúde em parceria com a ONG Reprolatina, de Campinas. Cada escola cria um núcleo de apoio sob a responsabilidade de alunos voluntários capacitados. Quando se trata de temas relativos à sexualidade, é mais fácil conversar com alguém da mesma idade, conta Elaine Pedro, coordenadora do programa. Depois de garantir informação e orientação, é preciso possibilitar o acesso a serviços disponíveis nos postos de saúde (como exames pré-natal) e a materiais como camisinhas e outros métodos anticoncepcionais. São os monitores que ajudam nessa divulgação, conta Margarita Díaz, diretora da Reprolatina e uma das idealizadoras do programa.
O mesmo modelo foi adotado no Vale Juventude, iniciativa da Fundação Vale e das secretarias municipais de Educação de dez municípios de Minas Gerais e cinco do Pará. Mas, além de formar agentes multiplicadores entre a garotada da escola, o projeto trabalha também com a capacitação de educadores, que devem estar preparados para abordar qualquer tema relativo à sexualidade com as turmas sempre que houver necessidade. Os cursos de 80 horas e os workshops anuais devem ser freqüentados por todos os professores da rede. Disponibilizamos seqüências didáticas que instrumentalizam o educador a abordar a questão em sala de aula, explica Aline Tôrre, analista da Fundação Vale.
Para evitar a evasão
Pense nas seguintes possibilidades para que grávidas e mães se sintam estimuladas a continuar os estudos:
? Flexibilizar os horários das aulas e o número de faltas. São comuns sintomas como enjôos e indisposição durante os nove meses e, além disso, é preciso tempo para fazer o pré-natal.
? Oferecer datas e horários alternativos para provas e entrega de trabalhos quando a falta ocorrer por razões médicas ou para cuidar do bebê.
? Disponibilizar classes de recuperação para quem tiver dificuldade em acompanhar o ritmo de aprendizagem.
? Trabalhar o tema com todos os alunos da escola para que se dissipe qualquer visão preconceituosa em relação à futura mãe.
? Conversar com a jovem que falta com freqüência para convencê-la a voltar aos estudos.
? Sugerir que as mães procurem vagas em creches próximas à escola. Se for preciso, procure a Secretaria de Educação e peça ajuda.
Evasão escolar
O Vale Juventude também ensina professores e diretores a evitar que grávidas e mães abandonem os estudos. O primeiro passo é impedir a discriminação: Muitas adolescentes sentem vergonha e medo do julgamento e colegas e professores. Por isso, trabalhamos o tema com toda a escola, ressalta Aline. Outro passo é f lexibilizar horários e o número de faltas permitidas. A EE Fazenda da Betânia, em Itabira, a 100 quilômetros de Belo Horizonte, reduziu a zero a evasão nesses casos com medidas simples. A diretora Jânea Martins Gomes permite que aulas perdidas para ir ao médico ou para cuidar do bebê sejam repostas em outra turma e que as grávidas façam trabalhos em casa (mais sugestões para evitar a evasão no quadro da página anterior). Estudei até os últimos dias de gestação porque fui muito incentivada pelos professores e pela diretora, conta Shirley da Silva Ramos, de 16 anos, que confessa ter pensado abandonar a escola quando soube que seria mãe, na 8ª série. Ao voltar da licença, fiz todos os trabalhos e avaliações que havia perdido. Em pouco tempo já estava acompanhando normalmente a turma. Na EE Odilon Behrens, em Barão de Cocais, a 90 quilômetros de Belo Horizonte, a luta para evitar que meninas grávidas deixem de estudar vai além dos horários alternativos. Maria de Lourdes Drepalde, coordenadora do programa, visita todas em casa para convencê-las a voltar, como fez com Francislaine Fernandes Dias, 16 anos. Expliquei a ela e aos pais que não há impedimento em continuar freqüentando as aulas. Deixei-os à vontade para conversar sobre o assunto sempre que tivessem dúvida ou precisassem de orientação, mostrando que estamos prontos para ajudar, conta Maria de Lourdes. Com isso elas se sentem acolhidas e sabem que têm um porto seguro.
Quer saber mais?
CONTATO
EE Antonio Duarte de Castro, Al. Jacumã, 86, 11940-000, Jacupiranga, SP, tel. (13) 3864-1442
EE Fazenda da Betânia, R. Pássaro Verde, 618, 35904-000, Itabira, MG, tel. (31) 3839-7462
EE Odilon Behrens, R. Monsenhor Horta, 57, 35970-000, Barão de Cocais, MG, tel. (31) 3837-2717
Fundação Vale
Grupo de Pesquisa e Trabalho em Orientação Sexual
Instituto Kaplan
Reprolatina
BIBLIOGRAFIA
Orientação Sexual na Escola: um Projeto
Apaixonante, Antonio Carlos Egypto (coord.), 144 págs., Ed. Cortez, tel. (11) 3611-9616 , 18 reais
Sexo, Prazeres e Riscos, Antonio Carlos Egypto, 96 págs., Ed. Saraiva, tel. (11) 3613-3030 , 30 reais
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