Matemática: Jogando para ganhar na aprendizagem
A palavra "lúdico" faz parte do vocabulário de todo o professor, mas não basta trazer a brincadeira para a sala de aula: é preciso ter os objetivos sempre em mente
29/11/2019
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Jornalismo
29/11/2019
Quem olha de fora pode achar que é bagunça: alunos conversando, rindo, às vezes até gritando. Mas não é nada disso, essa cena significa que uma aula de Matemática está acontecendo para a turma da professora Patrícia Alves Rodrigues, que dá aulas para o 3º ano da EE Constâncio Vieira, em Estância (SE). No último ano, a docente passou por formações que deram a ela pontos extras nas suas aulas e ajudaram a incluir os jogos de maneira mais orgânica. "Também recebemos materiais didáticos que propõem jogos para o início de todas as unidades de trabalho", conta a docente.
Você também, professor, já deve ter recorrido a jogos em suas aulas. A estratégia não é nova. O uso do "lúdico" para potencializar o ensino e a aprendizagem aparecem na fala de quase todo professor. "Antigamente, o jogo era um passatempo. O professor levava quando sobrava algum tempo na aula", lembra Fabrício Eduardo Ferreira, professor da rede municipal de Pindorama (SP) e mentor do Time de Autores dos planos de aula NOVA ESCOLA.
Mas esse recurso pode ser valioso para as aulas e até substituir outros recursos. "Em vez de se apresentar uma lista de exercícios ou problemas repetitivos, o professor pode levar um jogo", sugere Fernando Barnabé, diretor da rede Trilhas do Saber e da Edu.co Ensino Consultoria (leia entrevista completa com ele).
Ao selecionar um jogo – ou adaptá-lo –, é importante considerar, portanto, que os desafios enfrentados ao jogá-lo precisam estar relacionados às habilidades que estão sendo desenvolvidas, de acordo com o currículo. "O jogo é uma situação-problema não convencional", explica Flávia Cury, professora do 4º ano e assessora de Matemática para anos iniciais do Colégio Vital Brazil, em São Paulo. E assim como toda situação-problema, ele deve ser desafiador para os estudantes e ajudá-los a avançarem em seus conhecimentos.
Ao se planejar uma sequência didática, jogos podem entrar em diferentes momentos. "Ora ele é um disparador, ora ele vai ser uma forma de sistematizar determinado conteúdo", explica Flávia.
Nas aulas da professora Patrícia, os jogos são utilizados para iniciar sequências didáticas. Um exemplo é o Super Trunfo dos Dinossauros (baixe ele aqui). Para ganhar a competição, feita em duplas, os alunos precisavam comparar características desses animais pré-históricos, como peso e tamanho. "Muitos se deparavam com a necessidade de confrontar quilogramas com toneladas e isso criava um problema que eles precisavam resolver para descobrir quem ganhava", conta a educadora.
Há outros momentos, em que jogos podem ser utilizados para que estudantes coloquem em prática conhecimentos que já possuem – e consigam aprofundá-los, é claro. Um exemplo é o bingo da Tabuada, realizado por Flávia com suas turmas (conheça aqui as regras). Nele, a professora costuma chamar resultados de multiplicações e os estudantes devem procurar, nas cartelas, as contas que chegam àquele número. Nesse processo, exercitam o cálculo mental e a memorização da tabuada, mas não apenas. "Quando discutimos o jogo e compartilhamos estratégias para ganhá-lo, as crianças pensam em regularidades ligadas à tabuada", explica a professora.
Patrícia também vê a importância de usar o jogo como forma de avaliação, diagnóstica ou não. "No começo ou fim de sequências didáticas, é normal a gente perguntar o que os alunos conhecem sobre um tema, mas quando damos um jogo, eles precisam colocar isso em prática e conseguimos ter uma ideia melhor", diz.
Para Patrícia, outra grande mudança na maneira como os jogos são utilizados ocorreu ao conhecer melhores estratégias para realizar esse trabalho com a turma. Esse aprendizado se deu por formações realizadas pelo grupo Mathema com professores da rede onde ela trabalha.
Um dos pontos destacados foi a importância de jogar mais de uma vez. "A primeira é só para que as crianças se familiarizem com as regras e conheçam o jogo", explica Flávia. Nas vezes seguintes, normalmente feitas em outros dias de aula, os estudantes vão se aprofundando e entram em cena novas estratégias, tais como a discussão e o registro. "O professor deve pensar em quais temas poderão ser debatidos durante ou ao final do jogo e também pedir para que os alunos desenhem ou anotem informações", defende Fabrício. Essas estratégias destacam a intencionalidade do professor ao promover a prática.
A resistência à adoção de jogos pode se dar por uma série de motivos. O primeiro deles se dá por conta da organização da sala. "Já ouvi relatos de gestores que ficavam assustados, acreditando que a turma estava bagunçando", conta Fabrício Teixeira. Constatações assim são comuns no uso de diversas metodologias ativas, porque rompem com a lógica de professores falando e alunos quietos e enfileirados. É claro que, às vezes, os estudantes podem exagerar e surgem conflitos ou excesso de barulho. "Com o tempo e com o hábito, os estudantes se acostumam a jogar", explica o formador.
O uso de jogos, inclusive, é poderoso para abordar – além das habilidades previstas pela Base Nacional Comum Curricular (BNCC) – também algumas competências gerais e específicas: em jogos, eles precisam trabalhar em colaboração, resolver conflitos, solucionar problemas e argumentar sobre as estratégias usadas. É claro que, novamente, é preciso ter esses objetivos em mente. "Há momentos em que podemos avaliar mais atentamente questões comportamentais ou relacionais, em vez das ligadas aos conteúdos", conta Flávia Cury. O professor também pode dedicar momentos exclusivos para discutir as regras, combinados para o bom comportamento durante o jogo e resolver conflitos. "Em alguns jogos, antes de iniciar, eu faço um combinado com a turma sobre quantas rodadas faremos antes de encerrar", exemplifica Patrícia.
1. Defina objetivos: tenha em mente quais habilidades do currículo e quais os objetivos de aprendizagem precisam ser trabalhados.
2. Selecione os jogos: encontre opções que apresentem desafios ligados aos seus objetivos de aprendizagem. Também é possível adaptar jogos que você já conheça para que se relacionem com suas habilidades.
3. Encaixe em seu planejamento: pense se o jogo poderá ser utilizado no início, como um disparador, ou no meio de uma sequência didática, como maneira de retomar e aprofundar conhecimentos. Em todos os casos, ele precisa ser desafiador, e não apenas um treino.
4. Jogue – e bastante: permita que os estudantes joguem várias vezes, apropriando-se das regras e criando, gradativamente, estratégias matemáticas que os ajudem a ser cada vez melhores jogadores.
5. Amplie o foco: pense em competências ligadas à convivência, ao pensamento crítico e à argumentação que possam ser trabalhadas com o mesmo jogo e estabeleça momentos e estratégias que as tenham como foco.
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