Bom exemplo que vem de Nova York
Com autoridade e autonomia financeira, os gestores estão atacando o alto índice de evasão e a baixa aprendizagem
01/12/2009
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Jornalismo
01/12/2009
Eta mania que nós, educadores, temos de querer achar uma só solução para resolver questões complexas! Administrar uma escola ou, mais difícil ainda, uma rede é coisa cheia de variantes. Para a solução de suas mazelas, não bastam um modelo adequado de eleição da direção, um projeto pedagógico brilhante ou professores bem pagos ou com formação didática invejável. Claro que uma boa bandeira ajuda a juntar pessoas e ideias para resolver uma questão. "O povo unido jamais será vencido" ou "Diretas já". Essas palavras de ordem podem iniciar um processo, mas não resolvem, principalmente quando a questão é ampla e vem de longa data. A solução tem, sim, um ponto de partida, um ideal. Mas a sabedoria para enfrentar fenômeno tão complexo é outra coisa.
Em entrevista à NOVA ESCOLA GESTÃO ESCOLAR de dezembro/2009 e janeiro/2010, Chris Cerf, subsecretário de Educação de Nova York, conta como melhorou o desempenho das escolas da cidade, marcadas por problemas como alto índice de abandono, agressividade, baixa aprendizagem e pais descontentes. Ele indica: "Os diretores têm total autonomia". A provocação causada por esse slogan é importante, mas ela não acaba com todos os problemas.
Há sete anos, a prefeitura nova-iorquina iniciou uma reforma chamada Crianças em Primeiro Lugar. Esse mote, sim, desencadeou um debate e uma esperança que nenhum gestor, governo ou teórico havia levantado como bandeira para iniciar algo diferente que revertesse a curva de desânimo, descrédito e cinismo que frequentemente ronda as ações pretensamente educativas. Essa foi a chave para quebrar o paradigma de que "a escola pública não tem jeito mesmo".
Cerf é um encantado pela potencialidade da escola e pela importância da gestão. Para ele, o diretor é alguém que precisa se interessar pelas crianças e não pelo poder ou pela política partidária. Apesar de isso parecer óbvio, não é. Muitos deles por aqui são tão aficionados pelo status do cargo e pelas artimanhas do governo que não se dão conta de que a escola pode ser o único canal de participação na vida social e econômica de crianças, pais, professores e funcionários.
O trabalho relatado por Cerf em Nova York se baseia nessa ideia para construir uma nova modalidade de gestão. A principal mudança: o diretor ganha autoridade e autonomia financeira. Segundo ele, uma sem a outra leva ao desastre. Não é possível, na sua opinião, dizer ao gestor que ele deve levar todas as crianças a aprender em dois anos se ele receber um currículo predeterminado e for proibido de controlar o orçamento e contratar ou demitir professores. E mais: se houver autonomia sem a cobrança de metas, corre-se o risco de manter um dirigente que não acha importante os alunos concluírem o curso. Cerf tem razão. Precisa haver os dois lados.
O bom gestor é o que diagnostica bem a realidade e constrói um projeto com os pares, os estudantes, os professores e a comunidade. Mas isso não basta. É fundamental que ele saiba juntar forças, recursos, pessoas e ideais que viabilizem e realização das propostas. Aí, sim, a sua autonomia, sempre relativa, vai permitir que jogue bem com o orçamento, os concursos para a escolha do corpo docente, as avaliações de desempenho, as regras disciplinares e a burocracia do Estado.
Por compreender e ter vivido essa situação, Cerf diz que em lugares como Nova York e São Paulo uma reforma educacional requer tempo. Em nosso país, nós já iniciamos alguns enfrentamentos há décadas, mas muitos estão por ser encarados. A esperança que nos une é acreditar que, no Brasil ou no Zimbábue, a boa gestão é uma mola propulsora de mudança na escola. Não é a única, mas sem ela pouco ou nada ocorrerá.
É filósofo, docente da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) e vice-presidente da TV Cultura - Fundação Padre Anchieta.
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