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Jornalismo

Vamos à luta!

Além de trabalhar equilíbrio, regras e força, jogos de combate permitem discutir a violência e mostram a importância do respeito ao adversário

PorBianca Bibiano

01/05/2009

Fotos: Carol Sachs
O EQUILÍBRIO (à esq.) Na EMEF Antônio Carlos de Andrada e Silva, a turma pratica a postura de combate na esgrima. AS REGRAS (centro) Adaptada à escola, a modalidade tem espadas de papel, mas preserva os golpes principais. A FORÇA (à dir.) Os alunos percebem que, para ganhar, é preciso ter resistência para atacar e defender. Fotos: Carol Sachs

Na EMEF Antônio Carlos de Andrada e Silva, na capital paulista, a turma do 8º ano luta esgrima. As espadas e os floretes são pequenas lanças feitas de jornal, o tablado é o chão do pátio e marcam-se com tinta os golpes. Mas a concentração e o respeito ao adversário são iguais aos de um esgrimista profissional. Enquanto isso, na EEEM Santo Augusto, em Santo Augusto, a 512 quilômetros de Porto Alegre, os alunos do 7º ano experimentam o judô. Eles aprendem as noções de equilíbrio e desequilíbrio de joelhos no chão, em combates adaptados para evitar quedas. Não é a arte marcial como se vê nas Olimpíadas, mas cumpre o mais importante: compreender os princípios de movimento que estruturam a modalidade.

Esses dois casos ilustram bem como as lutas devem ser trabalhadas no ambiente escolar. Como sugerem os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) de Educação Física, elas são conteúdos que ajudam os estudantes a ampliar o universo cultural e a conhecer outras manifestações corporais. "É uma perspectiva bem diferente, por exemplo, da abordagem de academias e do esporte de alto rendimento, em que a ênfase recai na competição e no aperfeiçoamento de golpes e estratégias de combate", explica Fábio D?Angelo, coordenador pedagógico do Instituto Esporte e Educação, em São Paulo, e selecionador do Prêmio Victor Civita - Educador Nota 10.

Por isso, esse trabalho com lutas na disciplina não precisa, necessariamente, incluir atividades físicas. Ensinar a filosofia e os valores de uma modalidade pode mostrar muito aos alunos. O ato de lutar é algo próprio da cultura humana, tanto por questões de sobrevivência quanto de lazer. Nessa tarefa, é importante mostrar em qual contexto uma determinada luta surgiu e como ela se insere na cultura de sua época. Ao trabalhar a esgrima, por exemplo, o professor pode observar aspectos históricos anteriores à formalização dela, por volta do século 19 (leia a sequência didática).

Se decidir trabalhar pelo viés do movimento, é preciso considerar a inclusão de alunos com deficiência física (a sequência didática traz sugestões de como adaptar as atividades para esses estudantes). Para que participem de forma ativa das aulas, você deve, primeiramente, conhecer as limitações deles. Por exemplo, se um aluno não possuir mobilidade nos membros inferiores, pode-se privilegiar atividades que tenham o foco no movimento dos braços. Para que o trabalho de adaptação funcione, é importante que o médico ou o fisioterapeuta responsável mantenha a escola informada a respeito do potencial e das limitações dos jovens.

Três habilidades são comuns à maioria das modalidades 

Fotos: Jean Pimentel
O EQUILÍBRIO (à esq.)  Na EEEM Santo Augusto, os alunos vivenciam os movimentos do judô em um jogo de combate.  AS REGRAS (centro)  Os estudantes conhecem os fundamentos do judô e os adaptam para que todos possam participar. A FORÇA (à dir.)  No enfrentamento, cada um evita cair de costas, o que decreta o fim do combate. Fotos: Jean Pimentel

Qualquer que seja o tipo de luta escolhido, você deve enfatizar o trabalho com as três habilidades que estruturam a maioria delas: equilíbrio e desequilíbrio (o que inclui as quedas e o deslocamento do adversário da área da disputa), noções básicas de golpes e técnicas de força e resistência (veja os exemplos da esgrima e do judô nas fotos que ilustram esta reportagem). Uma boa alternativa para trabalhar o movimento sem precisar avançar no caráter estritamente técnico é apresentar os chamados jogos de luta. Pelo caráter mais lúdico, alguns podem parecer brincadeiras de criança, como o cabo-de-guerra. Mas a turma vai se surpreender ao descobrir que ele já foi um esporte olímpico. Também é a deixa para desmistificar a ideia de que o maior e mais forte sempre vence - com o cabo-de-guerra, vai ficar claro que não basta puxar mais para ganhar, mas que a posição de pernas e braços e o esforço coordenado também são essenciais.

Discussões com a turma devem fazer parte de todas as aulas. É por meio delas que todos entendem que a luta é regida por regras e é uma representação do combate, com valores que remetem à cultura em que foi criada. "Ainda assim, o enfrentamento direto não deve ser excluído, desde que abordando o respeito às regras e aos colegas", afirma Eduardo Augusto Carreiro, especialista em motricidade humana e gerente de esportes e lazer do Serviço Social da Indústria (Sesi), em São Paulo. São ressalvas, porém, o jiu-jítsu e o boxe. Por estarem relacionados à violência, é importante que sejam abordados de maneira bastante cuidadosa, focando mais as discussões do que os movimentos. Se a opção for essa última, a prática deve evitar o confronto direto, como fez a professora Luciana Venâncio na EMEF Antônio Carlos de Andrada e Silva. Lá, os alunos do 9º ano estudaram o boxe, mas, na hora adaptar os movimentos, utilizaram bexigas e colchonetes para praticar golpes, em vez de lutarem uns com os outros.

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CONTATOS
Daniela Alonso
Eduardo Augusto Carreiro
EEEM Santo Augusto, R. Professor Romalino Torres, 108, 98590-000, Santo Augusto, RS, tel. (55) 3781-1412
EMEF Antônio Carlos de Andrada e Silva, R. Baltazar Santana, 365, 08040-420, São Paulo, SP, tel. (11) 2054-1899
Fábio D?Angelo

BIBLIOGRAFIA
Educação Física na Escola: Implicações para Prática Pedagógica, Suraya Cristina Darido e Irene Conceição Andrade Rangel, 316 págs., Ed. Guanabara Koogan, tel. (21) 3543-0770, 77 reais 

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